As entidades organizadoras do Seminário “Reforma Tributária para um Brasil mais Justo”, realizado em São Paulo nesta quinta-feira, 28 de setembro de 2023, e os representantes das entidades sindicais e associativas presentes aprovaram a manifestação de apoio às medidas encaminhadas pelo governo ao Congresso Nacional para tributar os fundos exclusivos, os ganhos em investimentos offshore e revogar a dedutibilidade dos juros sobre o capital próprio.
“Os organizadores e participantes do evento, conclamam os parlamentares a aprovarem essas medidas, por considerarem que as mesmas corrigem importantes distorções no sistema de tributação que beneficiam apenas os super-ricos”, diz o documento.
O conjunto de organizações também demandam o governo a criar condições para fortalecer a administração tributária, dotando-a dos instrumentos necessários para a efetiva aplicação da nova legislação.
O seminário foi promovido pelo Sindicato dos Auditores-Fiscais da Receita Federal (Sindifisco Nacional), o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Econômicos (Dieese), a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e o Instituto Justiça Fiscal (IJF). A atividade contou com participação gravada do Nobel de Economia, Joseph Stiglitz, defensor da tributação progressiva da renda dos super-ricos, item de debate nacional na segunda etapa da reforma tributária no país.
O evento híbrido e gratuito foi transmitido pelas plataformas das entidades promotoras.
O desafio de colocar os super-ricos no Imposto de Renda
“Toda a sociedade deve discutir tributos e definir coletivamente de quem tirar e com o que gastar. Não pode ficar na mão de economista, acadêmico e especialistas”, entende o economista e professor da Unicamp, Pedro Rossi, primeiro palestrante do painel da tarde. Para ele, uma reforma pode ser revolucionária, instrumento poderoso apropriado pelas elites e deve ser disputado pela sociedade.
“A reforma tributária deve garantir tributação da renda do capital e não apenas do trabalho, como ocorre. Impostos devem ser vistos como contribuição à cidadania, vinculados a direitos. Hoje o conceito de imposto está distorcido, tratado como se fosse usurpado das pessoas”, observou.
“O sistema tributário alimenta a desigualdade. Combater a regressividade é fazer justiça. Donos de capital não querem pagar nem sobre o estoque nem sobre o fluxo. Isso é injusto”, reafirma o professor da Unicamp, Francisco Lopreato. “Não é para punir o capital, mas fazer justiça fiscal cortando as distorções mais agudas”, insistiu.
Exemplificou a injusta estratificação dos impostos que privilegia isenções e subtributação aos abastados como o ITR, ganhos de capital, fundos exclusivos e IR. Destacou os privilégios da pessoa jurídica como as distorções dos optantes do Simples – usado por grandes faturamentos – e o lucro presumido que vai até R$ 78 milhões.
“Tributar super-ricos não é apenas aumentar a arrecadação, mas acabar com as distorções do sistema tributário. Isso sinaliza outra trajetória de avançar numa sociedade mais justa e igualitária”, concluiu.
O integrante do Instituto Justiça Fiscal Paulo Gil afirmou que os privilégios tributários levam à concentração de renda, riqueza e poder, constituindo um ciclo vicioso.
Revelou a sorrateira e silenciosa reforma tributária realizada na década de 1990, sem alterações constitucionais, com deslocamento do ônus para os mais pobres. “Foram criados benefícios sofisticados, como desoneração das rendas do capital, isenção dos ganhos de sócios e acionistas, dedução de juros sobre capital próprio, entre outras distorções perpetuadas.
Destacou a realização da campanha Tributar os Super-ricos desenvolvida há três anos por um conjunto de 70 entidades propondo alterações no sistema, permitindo arrecadar cerca de R$ 350 bilhões “dependendo da correlação de forças”.
Para a presidenta da Contraf-CUT, vice-presidenta da CUT e integrante da campanha, Juvandia Moreira, o mundo do trabalho precisa se apropriar definitivamente dessa pauta e promover muita mobilização para garantir justiça fiscal.
A auditora fiscal aposentada e consultora tributária do FMI, Clair Hickmann, analisou os recentes projetos do governo federal para tributar super-ricos. Especialistas em paraísos fiscais, detalhou os aspectos positivos do PL das Offshores e Trusts, que prevê taxar os rendimentos do capital de brasileiros aplicados no exterior com alíquotas progressivas de zero a 22,5%; e a Medida Provisória para tributar fundos de investimento de 2,5 mil super-ricos que tem regras privilegiadas nos fundos exclusivos cobrando 15% a 20% sobre os rendimentos.
Desonerar a folha vulnerabiliza a Previdência
O desafio da desestruturação do mercado de trabalho e o financiamento da sustentabilidade da Previdência ocuparam o diálogo do último painel que tratou da desoneração da folha de pagamento.
Pedro Humberto Carvalho Júnior, do Ipea, apresentou um estudo comparativo entre 70 países dos sistemas de contribuição previdenciária demonstrando que é falacioso o argumento de que no Brasil as contribuições são altas (Veja estudo neste link).
Leandro Horie, do Dieese, demonstrou com análise histórica (veja link) os falsos impactos da desoneração na geração de empregos. “É pouco eficiente, muito problemática e impacta a política de Previdência social”, concluiu o pesquisador.
Para Horie, a desoneração erode a base da arrecadação da Seguridade e vulnerabiliza definitivamente o futuro dos trabalhadores aposentados, podendo ser um cavalo de tróia inclusive para a insinuação de outra reforma previdenciária ainda mais danosa.
Para José Dari Krein, da Unicamp, é preciso enfrentar o seríssimo debate sobre o financiamento previdenciário frente a desregulamentação do mercado do trabalho. O mercado estruturado integra emprego mais proteção social, conjunto severamente comprometido diante da informalidade ou da pejotização. “Trabalhadores se veem obrigados a se adaptar para sobreviver e precisamos debater essa realidade de forma aprofundada”, concluiu.
A cobertura dos debates da manhã estão neste link.
Foto: Sindifisco Nacional