União pode cobrar 70% menos de empresas em recuperação judicial

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Após editar uma MP (medida provisória) que concede descontos para empresas quitarem dívidas com a União, o governo quer ampliar ainda mais os benefícios para estimular o pagamento pendente de companhias em RJ (recuperação judicial).

A chamada MP do Contribuinte Legal, em vigor desde outubro, autoriza reduções de até 50% no valor que o governo cobra das empresas.
Agora, projeto de lei que tem aval da equipe econômica e está pronto para votação no plenário da Câmara autoriza o governo a perdoar até 70% dos débitos que têm a receber de empresas em recuperação judicial.
Em simulação conservadora, o Ministério da Economia estima que a proposta provocará renúncia fiscal de R$ 885 milhões em três anos.
A pasta considera, entretanto, que o programa vai incentivar a recuperação de créditos que seriam perdidos se nenhuma regra fosse alterada. Com isso, prevê que o impacto total da medida será positivo em R$ 1,9 bilhão ao fim do período.

Em meio ao cenário de fraco desempenho da economia, cerca de 1.400 empresas que hoje estão em processo de RJ têm R$ 69 bilhões cobrados pela União, aponta levantamento da PGFN (Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional) obtido pela Folha.

Estão em discussão cobranças previdenciárias, de FGTS e de outros tributos, além de multas e juros.
Embora o número corresponda à metade do rombo fiscal estipulado para este ano, o nível de recuperação desses valores é muito baixo.
De 2014 a 2018, a União conseguiu reaver R$ 845 milhões aos cofres públicos de empresas nessa situação, pouco mais de 1% do montante.
Na tentativa de reverter esse cenário, o governo articula com o Congresso uma revisão na Lei de Falências. O texto cria um programa de refinanciamento.

O objetivo geral da proposta é melhorar os mecanismos de recuperação e ampliar as chances de sobrevivência das empresas, reduzindo também o risco de calote definitivo aos cofres públicos.
A recuperação judicial é um instrumento que pode ser usado por empresas em situação financeira crítica para evitar que cheguem à falência. Elas apresentam um plano para se reerguer e ganham prazo para pagar a credores.

De acordo com o levantamento do governo, 89% das pendências atualmente inscritas na Dívida Ativa da União são classificadas pelo Ministério da Economia como em situação irregular. O valor chega a R$ 61,5 bilhões.
O relator do projeto na Câmara, deputado Hugo Leal (PSD-RJ), afirma que o texto cria uma espécie de Refis —programa especial de refinanciamento de dívidas— direcionado a empresas em RJ.
As pendências poderão ser parceladas em até dez anos, e há possibilidade de concessão de desconto. Em outro ponto do texto, a Receita Federal ficará autorizada a negociar.

O governo poderá aceitar receber menos que o previsto inicialmente. Isso significa que, em alternativa ao parcelamento, a empresa em recuperação poderá propor o pagamento com essa redução de até 70% do total cobrado.
O montante principal, aquele que originou a cobrança, não poderá ter desconto. Membros do governo afirmam, entretanto, que multas e juros crescem em bola e neve e acabam ficando maiores que o principal.
De acordo com o relator, o fisco terá de “sentar à mesa” e negociar. Para a definição do desconto, o Ministério da Economia avaliará, entre outros pontos, a chance de o crédito ser perdido, considerando o risco de falência.
Membros da equipe econômica afirmam que esse desconto foi incluído no texto com uma condição. O governo terá direito de pedir a falência da companhia se houver descumprimento do acordo. A União estará entre os credores prioritários.

Desde o início do governo, o ministro da Economia, Paulo Guedes, e sua equipe criticam a concessão de descontos em dívidas fiscais e os parcelamentos especiais.

Eles argumentam que esses programas geram efeito perverso ao criar um estímulo ao não pagamento de tributos.
A proposta de alteração da Lei de Falências, porém, foi construída em parceria.

O relator da proposta argumenta que os descontos atendem a um segmento específico e observam uma série de critérios. Para ele, é preferível o governo receber menos a não receber nada no fim.
“O fisco está entendendo que é melhor fazer a negociação. Se não fizer isso, vai ficar sempre por último, tentando fazer a execução fiscal e não vai conseguir nada”, disse.

O texto em negociação também traz a possibilidade de as empresas compensarem prejuízos passados em tributos específicos, como PIS e Cofins.

Na Câmara, já foi aprovado o pedido de tramitação da proposta em regime de urgência. Com isso, o texto será analisado diretamente em plenário, sem a necessidade de avaliação por comissões temáticas.
O secretário especial de Fazenda do Ministério da Economia, Waldery Rodrigues, que acompanha a tramitação, disse que espera ver o texto aprovado ainda neste ano.

Para ele, a medida pode destravar a recuperação dos créditos. “Hoje, muitos casos ficam artificialmente parados porque o devedor não tem condições mínimas de seguir em frente”, disse em outubro.

Folha procurou as empresas em recuperação listadas com os dez maiores valores inscritos na dívida ativa. Duas se manifestaram, e as outras não foram localizadas ou preferiram não se manifestar.
A Dedini Indústrias de Base informou que existem várias ações em discussão e que busca a regularização da situação tributária. A Teka afirma que não reconhece o passivo tributário, que se encontra em discussão judicial.


Reportagem publicada pela Folha.