por Grazielle C. David, do INESC.
Ontem à noite anunciaram que a greve dos caminhoneiros chegaria ao fim com a adoção de algumas medidas, entre elas: redução de 46 centavos no preço do litro de diesel por 60 dias, seguido por reajuste mensal ao invés de diário.
Primeiro, a greve dos caminhoneiros mexeu apenas no preço do diesel. Então, para gasolina, o drama do reajuste diário dos preços segue. Segundo, o diesel voltará a ser reajustado mensalmente após 60 dias.
O principal tributo sobre o combustível é o ICMS e não o PIS, a COFINS e a CIDE. A questão é que o ICMS não é federal como os demais, e sim o principal tributo estadual. Outra questão é que os tributos que foram reduzidos, PIS e Cofins estão na base de financiamento do Orçamento da Seguridade Social (Previdência, Saúde e Assistência), o que pode vir a comprometer seu financiamento.
A previsão do governo é de que o gasto tributário (renúncia fiscal) desses tributos, junto às outras 4 medidas, gire em torno de R$ 10 bilhões. O governo anunciou que esse custo não ficará para a Petrobrás, mas será absorvido pelo orçamento federal.
Ocorre que o orçamento federal está sujeito à EC 95, “teto dos gastos”. Para que esse impacto orçamentário não seja contabilizado dentro do teto, o governo vai abrir um crédito extraordinário para esse gasto tributário. Dessa forma, se encaixa em uma das exceções do teto. Ainda assim, pela Lei de Responsabilidade Fiscal e pela EC 95 terá que explicar de onde irá remanejar o dinheiro. Isso quer dizer que alguma outra política pública será afetada para que por dois meses o diesel fique com os tributos zerados. Hoje saberemos que políticas são essas.
Outra coisa importante a ser considerada quando falamos em gasto tributário é que no Brasil não existe transparência de quem são os beneficiários dessa renúncia fiscal. Então, daqui dois meses, quando quisermos avaliar quem de fato se beneficiou dessa medida, não será possível saber. Foram os caminhoneiros autônomos? Foram os donos das empresas? Quais empresas? Impossível saber.
Numa interpretação abusiva da lei de sigilo fiscal, os beneficiários finais dos gastos tributários são mantidos em sigilo. Aliás, esse seria um momento importantíssimo de pedirmos por “TRANSPARÊNCIA DOS BENEFICIÁRIOS DOS GASTOS TRIBUTÁRIOS”. Nada mais justo ao povo brasileiro do que poder conhecer daqui dois meses quem se beneficiou das medidas adotadas nesses dias de caos.
Apesar de todos esses efeitos no orçamento público e consequentemente na vida da população brasileira, essa é uma solução meramente temporária e paliativa, que não resolve de fato o problema dos altos preços do combustível. Por trás do aumento dos preços dos combustíveis nos últimos meses não está um aumento dos tributos e sim a NOVA POLÍTCA DE PREÇOS DA PETROBRÁS, que detalharei no próximo post.
Eu sei que o texto já está grande, mas tem uma questão essencial que temos que falar sempre que falamos em tributos: o Brasil precisa urgente de uma REFORMA TRIBUTÁRIA COM JUSTIÇA FISCAL. PIS, COFINS, ICMS são todos tributos indiretos, que incidem sobre o consumo, sendo bastante regressivos, e tendo um peso proporcional muito maior sobre os pobres e classe média. E essa é a lógica de todo o nosso sistema tributário. Mais de 50% dos nossos tributos são regressivos. É urgente que a carga tributária brasileira seja redistribuída, saindo dos tributos sobre consumo para tributos sobre a renda. Isso aliviaria o preço dos produtos (inclusive combustível) e seria mais justo, já que quem tem mais, contribuiria mais proporcionalmente.