Reforma da Previdência é imposição do Capital Financeiro, por Adriano Corrêa

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Por Adriano Corrêa
11/03/2017
A Previdência Social brasileira é o maior programa de redistribuição de renda do mundo.
Num país tão desigual como o Brasil o sistema de proteção social é imprescindível.
O sistema tripartite da Constituição de 1988 – contribuição do empregador, contribuição do empregado, contribuição do Estado, foi tão bem pensado que, desde então, tem assegurado, com as diversas fontes de financiamento, o superávit da Seguridade Social – Previdência Social, Assistência Social e Saúde.
O legislador constituinte agiu com prudente sabedoria ao insculpir o mandamento constitucional de que a Seguridade Social deve ser financiada por toda sociedade, de forma direta e indireta.

O FIM DO ESTADO DE BEM-ESTAR SOCIAL
A reforma da Previdência, se aprovada, implode o Estado de bem-estar social.
O primeiro efeito da reforma será a exclusão de milhões de trabalhadores do acesso à renda da aposentadoria na velhice.
Seja pela incapacidade do trabalhador de cumprir os severos requisitos, seja pelo desinteresse das futuras gerações em aderir ao modelo proposto, que exigirá pelo menos cinquenta anos de trabalho para obtenção de aposentadoria de valor aproximado ao salário da ativa.

A APETITOSA FATIA DA PREVIDÊNCIA
Os gastos previdenciários representam atualmente cerca de um quinto do orçamento federal. Há duas décadas a fatia era de um terço. No final da década de 1980, logo depois da promulgação da Constituição, equivaliam a 40%.
A curva descendente é resultante de duas reformas, uma em 1998, no governo FHC; outra em 2003, com Lula.
Não obstante a redução relativa, a agenda da reforma é imposição dos detentores do capital financeiro.
Estão famintos pela apetitosa – e ainda expressiva – fatia.

O CAPITAL É INSACIÁVEL
Por óbvio, o capital não está interessado em inclusão, em geração de emprego, em políticas sociais.
Sedento, insaciável e voraz, o que interessa para o capital, sempre, é aumentar a margem de lucro – e avançar no grau de concentração dos oligopólios.
O segundo efeito será a brutal transferência de poupança pública para o capital privado.
De um lado, a desidratação do sistema oficial; de outro, o impulso e o grande estímulo à privatização da Previdência, com os regimes de capitalização individual.
O principal norteador da Constituição, a solidariedade entre gerações, tornar-se-á letra morta.
Fazer a reforma no período de maior depressão do Brasil República, com índice recorde de desemprego e de precarização do trabalho, facilita a tarefa para o grande capital.

FALÁCIAS DIFICULTAM A COMPREENSÃO
No debate, há a falácia das contas.
O cálculo impróprio constantemente divulgado pelos meios de comunicação compara a arrecadação das contribuições previdenciárias x o pagamento de benefícios previdenciários.
Essa conta não reflete o ordenamento constitucional.
O correto é considerar todas as fontes de financiamento x gastos com Previdência, assistência social e saúde.
Há outra falácia: a comparação imprópria com a idade mínima de nações da comunidade europeia.
Em que pese o processo de envelhecimento da população e a mudança no formato da pirâmide, o IDH e a expectativa de vida do brasileiro ainda é muito inferior ao padrão europeu.
Não se pode comparar alho com bugalhos.

A OFENSIVA DO CAPITAL
Sem votos, mas com poder econômico incomum, com o mundo do trabalho em frangalhos, o capital não hesita em incidir em ofensiva.
Tanto é verdade que a reforma da Previdência é pauta do capital, que não se cogita, por exemplo, instituir o imposto sobre grandes fortunas, nem tributar os lucros e dividendos distribuídos aos sócios, tampouco acabar com a farra das desonerações tributárias.
Dados da ANFIP revelam que o agronegócio, que é Tech, que é Pop, por exemplo, produz R$ 600 bilhões anualmente, exporta U$S 100 bilhões e contribuiu tão somente com R$ 7 bilhões para a aposentadoria.

O QUE FAZER?
Antes de propor a reforma, o governo deveria rever as desonerações; reavaliar as renúncias fiscais; acabar com a Desvinculação das Receitas da União (DRU) – que retira 30% do orçamento da Seguridade; combater a sonegação; cobrar a dívida ativa previdenciária; mudar a regra prescricional das ações judiciais e equacionar a previdência rural
Para os rentistas é mais fácil espetar a conta no andar de baixo.
Para os que vivem de salário não há alternativa, senão resistir.


Adriano Corrêa é Auditor Fiscal da Receita Federal do Brasil e integrante do Instituto Justiça Fiscal.