IJF disponibiliza documento em que analisa renúncias fiscais da União

O tema das renúncias fiscais é de extrema relevância quando tratamos de reforma tributária e dos efeitos que estas podem produzir na economia e na sociedade brasileiras.

O Instituto Justiça Fiscal (IJF) elaborou o documento “Renúncias fiscais ou gasto tributário” para subsidiar as discussões do eixo de economia, no âmbito do Projeto Brasil Popular, por entender que:

“As renúncias fiscais precisam ser incluídas no debate sobre a tributação não apenas por afetarem o financiamento das políticas públicas, mas, sobretudo, por terem um papel relevante na função redistributiva do sistema tributário e na formulação de políticas alternativas de desenvolvimento econômico e social.”

Os autores alertam para alguns cuidados iniciais importantes nas discussões. O primeiro é que o tema específico das renúncias fiscais, como ocorre em relação ao debate da tributação em geral, traz embutidas as contradições inerentes aos conflitos distributivos entre os diversos segmentos sociais. Portanto, é preciso perceber que o debate carrega forte componente ideológico.

O segundo cuidado que os autores consideram importante é que as renúncias fiscais não são ruins por princípio e podem ser importante instrumento de política econômica e social. Devem, contudo, ser transparentes, observar a função fiscal e extrafiscal de cada renúncia. Além disso, é necessário que identifiquem a quem beneficiam e a quem prejudicam. Defendem, ainda, a avaliação periódica dos efeitos e resultados de cada renúncia fiscal.  

Os autores apontam a contradição, nos documentos elaborados pelos órgãos governamentais, entre o conceito de “gasto tributário” e o “demonstrativo de gasto tributário”, que acompanha o projeto de lei orçamentária anual (PLOA). De acordo com o conceito oficial, o “gasto tributário” compõe o conjunto de desonerações tributárias que promovem presunções creditícias, isenções, anistias, reduções, abatimentos e diferimentos de obrigações de natureza tributária”. No entanto, o Demonstrativo oficial (DGT) contradiz o conceito ao utilizar dois pesos e duas medidas, a depender do beneficiário do “gasto tributário”. Algumas dessas contradições são:

  1. O demonstrativo (DGT) não apresenta o valor da maior renúncia fiscal, representada pela isenção do Imposto de Renda sobre os rendimentos recebidos a título de lucros e dividendos pelos sócios e acionistas, enquanto indica os benefícios fiscais do Simples Nacional – ​Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribuições devidos pelas Microempresas e Empresas de Pequeno Porte – como o principal gasto tributário nos últimos anos;
  2. O relatório (DGT) também não informa os números do benefício fiscal com a dedução dos juros sobre o capital próprio no lucro tributável, que reduz o imposto de renda da pessoa jurídica; 
  3. O documento (DGT) omite a renúncia com as isenções de imposto de renda concedidas para rendimentos e ganhos de capital auferidos por estrangeiros no mercado especulativo e de renda fixa; porém, a desoneração do imposto de renda dos rendimentos auferidos por pessoa física em contas de depósitos de poupança é demonstrada; 
  4. Anistias e remissões concedidas nos programas de financiamentos especiais (Refis) também não são computadas no relatório;
  5. A desoneração da cesta básica é incluída como gasto tributário, mas os benefícios à exportação de produtos primários e minérios, contudo, não são relacionados.

Não por acaso, os benefícios fiscais omitidos do demonstrativo oficial (DGT) favorecem, principalmente, os contribuintes que recebem rendas do capital, o segmento mais favorecido da sociedade brasileira. Essas renúncias, além de significarem tributos que deixam de ser arrecadados, contribuem para agravar a regressividade do sistema tributário.

Portanto, o valor dos gastos tributários constantes do relatório DGT está longe de representar o total efetivo das renúncias fiscais da União.

A omissão de diversos benefícios no demonstrativo oficial (DGT) revela o descumprimento dos princípios constitucionais da transparência e publicidade.

O documento do IJF, que não esgota o assunto, também apresenta e analisa as justificativas oficiais sobre a omissão de algumas desonerações no Demonstrativo; analisa e comenta, ainda, os principais gastos tributários do relatório (DGT) de 2021 e, por fim, defende a necessidade de uma reavaliação aprofundada das atuais renúncias fiscais a partir de alguns princípios e critérios, tais como:

  1. Garantia de transparência e publicidade;
  2. Proteção dos recursos para o financiamento da Seguridade Social;
  3. Estímulo à industrialização nacional;
  4. Fortalecimento da saúde e educação pública;
  5. Estímulo à produção de alimentos saudáveis, à preservação da natureza e meio ambiente;
  6. Reforço à adimplência no pagamento dos tributos;
  7. Respeito à autonomia financeira dos entes federados;
  8. Delimitar prazo de vigência para cada benefício fiscal;
  9. Mensurar e avaliar os incentivos periodicamente.

A título de conclusão, os autores afirmam:

“Espera-se que, com a revisão sistemática da validade e eficácia dos benefícios fiscais, estes possam ser bem utilizados, face às condições sociais ou econômicas que os justifiquem, o que propiciará uma melhor distribuição do ônus de cada tributo e eliminará distorções e tratamento anti-isonômico entre pessoas que se encontram em situações equivalentes.”


[1] Documento elaborado por Clair Maria Hickmann, Dão Real Pereira dos Santos, Marcio Calvet Neves e Paulo Gil Holck Introíni, integrantes da diretoria do IJF.