Desde o final de 2014 a sociedade brasileira vem sendo coagida a acreditar que não há alternativa ao suicídio, exceto o juízo final diante dos mercados.
A reportagem foi publicada por Carta Maior, 06-10-2016.
A austeridade fiscal, rebatizada sugestivamente de ‘austericídio‘ no continente europeu, onde vigora há mais tempo e com resultados sabidos, tem sido prescrita aqui para um metabolismo econômico de sinais vitais declinantes.
A partir do golpe parlamentar de 31 de agosto, a dose transmudou-se em purga radical.
Indiferente à perda de pulso do doente espremido entre a conjura conservadora e o esgotamento de um ciclo de desenvolvimento, os científicos da austeridade cobram rigor redobrado na terapia.
Prescreve-se, entre outras coisas, 20 anos de coma induzido através da PEC 241, a PEC da Maldade, que atinge o coração da Constituição Cidadã de 1988, lancetando qualquer espaço de ganho real para o guarda-chuva de direitos, inscritos na Carta que completou 28 anos.
Ao contrário de reagir, a nação deriva.
Diagnósticos equivocados e argumentos falaciosos buscam na verdade subordinar a sociedade, definitiva e permanente, à supremacia da lógica rentista.
O resultado é a imposição de um outro projeto de país, que rasga princípios e valores pactuados na Assembleia Constituinte de 1987, sem a consulta à cidadania diretamente atingida pelo desmanche ardiloso da Carta Cidadã.
O documento “Austeridade e Retrocesso: Finanças Públicas e Política Fiscal no Brasil”, de iniciativa do GT de Macro da Sociedade Brasileira de Economia Política (SEP), Fórum 21, Fundação Friedrich Ebert e Plataforma Política Social apresenta uma análise aprofundada dessa encruzilhada.
Nele, o desafio fiscal é dissecado, apontando-se seus problemas reais, denunciando-se as falácias e mitos que sustentam um discurso supostamente ‘técnico’, na verdade atrelado a interesses políticos.
Essa análise é o produto de um trabalho coletivo de dezenas dos melhores economistas do país.
Sua primeira seção intitulada ‘Superávit primário: a insensatez conduz a política fiscal‘ trata do papel da política fiscal no crescimento, bem como dos efeitos perversos da austeridade sobre a atividade econômica, ademais das lacunas do regime fiscal brasileiro e das alternativas para a sua reforma.
A seção 2, ‘Dívida pública e a gestão macroeconômica‘, trata inicialmente dasconsequências econômicas da dívida pública e dos mitos que a envolvem. Mostra ainda a evolução recente da dívida líquida e da bruta no país, apontando seus determinantes e desmistificando a ideia de que o superávit primário é a variável central para controle da dívida, como propõe a PEC da Maldade.
Já a seção 3, intitulada ‘Gasto público e o perigoso caminho da austeridade‘, aborda aevolução do gasto público no Brasil; inclui-se aqui uma retrospectiva da histórica econômica recente do país tendo a questão fiscal como foco.
Por fim, a seção 4, ‘Reforma tributária progressiva:uma agenda negligenciada‘, aponta os principais problemas da injusta carga tributária brasileira, elenca alternativas para o financiamento do Estado Social no Brasil, e apresenta uma proposta de reforma tributária centrada na taxação da distribuição de lucros e dividendos, dentre outras mudanças necessárias na atual estrutura complexa e injusta.
Espera-se que esta leitura amplie o discernimento da grave transição de ciclo de desenvolvimento vivida pelo país.
Superá-la requer, antes de mais nada, desnudar interesses poderosos que embora se avoquem os de toda a sociedade, representam uma minoria dos cidadãos e cidadãs cujo trabalho,verdadeiramente, constrói a nação.
Leia o documento aqui.
Disponível em http://www.ihu.unisinos.br/560938-economistas-rejeitam-ultimato-e-propoem-alternativa-a-pec-241