RESUMO: A elevada carga tributária no Brasil é tema frequente de debates na sociedade, bem como a discussão quanto à sobrecarga suportada pelos contribuintes adimplentes em função da evasão tributária existente. A busca pela justiça fiscal pressupõe a observância da capacidade contributiva, mas também o efetivo combate à sonegação fiscal. Os resultados indicaram que, mantendo todos os demais parâmetros constantes, a arrecadação tributária brasileira poderia se expandir em 23,9% caso fosse possível eliminar a evasão tributária cujo indicador médio para todos os tributos apontado neste trabalho foi da ordem de 8,4% do PIB.
Na hipótese ainda de se levar em conta apenas a média dos indicadores de sonegação dos tributos que têm maior relevância para a arrecadação (ICMS, Imposto de Renda e Contribuições Previdenciárias) poder-se-ia estimar um indicador de sonegação de 28,4% da arrecadação (percentual muito próximo do indicador de sonegação para o VAT em países da América Latina que foi de 27,6%), que equivale a 10,0% do PIB, o que representaria o valor de R$ 415,1 bilhões caso levado em conta o PIB do ano de 2011. Tomando-se em consideração esse último indicador para a sonegação, poder-se- ia afirmar que se não houvesse evasão, o peso da carga tributária poderia ser reduzida em quase 30% e ainda manter o mesmo nível de arrecadação. Esses R$ 415,1 bilhões estimados de sonegação tributária são superiores a tudo o que foi arrecadado, em 2011, de Imposto de Renda (R$278,3 bilhões), a mais do que foi arrecadado de tributos sobre a Folha e Salários (R$ 376,8 bilhões) e a mais da metade do que foi tributado sobre Bens e Serviços (R$ 720,1 bilhões).
Por fim, registra-se que o presente relatório não teve pretensão de esgotar o assunto e sim de fomentar a discussão sobre a justiça fiscal e sobre o ainda alarmante patamar de sonegação tributária no Brasil.
Palavras-chave: sonegação; evasão fiscal; justiça fiscal.
CONTEÚDO
1 – INTRODUÇÃO
2 – CARGA TRIBUTÁRIA NO BRASIL E NO MUNDO
3 – SONEGAÇÃO FISCAL: determinantes e estimativas – Racionalidade da sonegação fiscal : aspectos econômicos e culturais
4 – MODELO TEÓRICO
4.1 – Metodologias de Estimação: características e dificuldades
4.2 – Revisão da Literatura: Características e Limitações de Outros Estudos
5 – ESTIMAÇÃO
5.1 – Resultados Nacionais
5.2 – Outros Resultados no Brasil e ao Redor do Mundo
6 – CONCLUSÕES
7 – BIBLIOGRAFIA
1 – INTRODUÇÃO
A inspiração do presente trabalho partiu da necessidade verificada pelo Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional – SINPROFAZ de aprofundar a discussão sobre a Justiça Fiscal, sobre a carga tributária e sobre o relacionamento do Estado com o Cidadão, tanto na perspectiva “estado-fisco x cidadão- contribuinte”, quanto sob o prisma do “estado-provedor x cidadão-beneficiário” de serviços públicos. A busca pela justiça fiscal pressupõe a observância da capacidade contributiva, mas também o efetivo combate à sonegação fiscal.
Desde o surgimento dos Estados Nacionais, as demandas da sociedade em muito ultrapassaram a segurança nacional. A proteção militar da sociedade, por si só, tornou- se incrivelmente honerosa com o avanço tecnológico, sempre ultrapassando a casa dos bilhões de dólares, não raro chegando aos trilhões nos orçamentos dos países líderes em tecnologia militar, como EUA e Rússia. Mas além da proteção militar da sociedade, entrou na lista a segurança pública em geral, saúde, educação, transporte coletivo, moradia, pesquisa, desenvolvimento e inovação tecnológica, para ficar em uma breve lista. Tais itens demandam recursos significativos da sociedade, pois, afinal, todo direito tem custo (HOLMES, 1999).
Efetivamente, ao longo do século 20, a maioria dos países do mundo, se não todos, experimentaram aumento substancial da carga tributária. No caso do Brasil, segundo OLIVEIRA (2010), em entre 1916 e 1920 a carga tributária brasileira era de 7% do PIB, enquanto que neste início de século 21 se aproxima dos 40% do PIB. Muitos impostos e Estados endividados levaram à criação de indicadores simplificados de alerta sobre o comportamento das finanças públicas para a população em geral, como o “impostômetro” e o “debt clock”. 1
Neste sentido, as sociedades demandam dos respectivos Estados vários serviços coletivos, e as empresas, fonte mór de geração de riqueza nas economias capitalistas, demandam melhores condições para produzir, menos impostos e regras tributárias mais simples em particular. A pressão competitiva, muitas vezes, induz à sonegação. Mas não só isso.
Quando a carga tributária é muito alta e a probabilidade de detectar a sonegação é baixa, é economicamente racional para pessoas físicas e jurídicas sonegar. Elementos culturais interferem na frequência e intensidade da sonegação, mas fato é que a sonegação está presente em todas as sociedades. Tão presente que não raro o cidadão se pergunta “onde estão aqueles bilhões sonegados?” (MURPHY, 2008) e surgem demandas por indicadores simples de sonegação nos moldes dos indicadores de arrecadação e dívida pública.
Porém, dada a complexidade dos sistemas tributários, do brasileiro em particular, conforme mostra OLIVEIRA (2010), construir tal indicador não é algo tão trivial. Estudiosos há muito se debruçam na análise dos mais variados aspectos das exações tributárias. Existem no Brasil diversos trabalhos sobre os princípios constitucionais tributários (razoabilidade, capacidade contributiva, etc.), sobre as obrigações tributárias em geral, sobre os tributos em espécie, entre outros. Entretanto, pouco se tem estudado sobre as distorções do sistema tributário e em especial sobre a quantificação da receita pública não realizada em virtude da sonegação.
POLINSKY e SHAVELL (2008) ressaltam que são quatro as escolhas públicas normalmente tomadas quanto à repressão aos transgressores das leis. A primeira escolha diz respeito ao tipo de pressuposto adotado pelo Estado para atribuir responsabilidade a determinado cidadão pelo descumprimento de regra de Direito, se o pressuposto da responsabilidade objetiva ou se o fundamento da responsabilidade subjetiva. O segundo ponto a ser considerado é se a sanção será monetária ou não monetária, ou se haverá a mescla dos dois tipos de sanção. A terceira escolha a ser feita, segundo os autores, diz respeito ao quantum da pena. E a quarta e não menos importante escolha pública diz respeito à probabilidade de detectar e de efetivamente punir os transgressores. Esta última variável está diretamente relacionada ao montante de recursos que o Estado está disposto a empregar para encontrar e efetivamente punir aqueles que descumprirem as leis.
É bem verdade que muitos Estados têm investido e sofisticado a estrutura de repressão aos sonegadores de modo a aumentar a probabilidade de detecção dos casos de sonegação. Entretanto, apesar dos esforços, algum nível de sonegação continua e continuará a existir em todos os países, até porque o aparato estatal necessário para descortinar cem por cento dos casos de sonegação seria tão custoso que inviabilizaria o próprio sistema tributário.
O objetivo deste estudo é estimar, com base em outros trabalhos já realizados, o nível de desvio de arrecadação no Brasil decorrente da sonegação fiscal. A tarefa é árdua, e este trabalho não tem intenção de exaurir a discussão, mas apenas pretende contribuir para a discussão, uma vez que é limitado o número de estudos que tentam mensurar esse desvio e geralmente se concentram em um ou um pequeno grupo de tributos.
2 – CARGA TRIBUTÁRIA NO BRASIL E NO MUNDO
A Carga Tributária Bruta brasileira (CTB) atingiu 35,51% do PIB, segundo dados publicados em 20122 pela Receita Federal do Brasil. Na própria definição de CTB da Receita Federal no “cálculo da Carga Tributária, busca-se aferir o fluxo de recursos financeiros direcionado da sociedade para o Estado que apresente características econômicas de tributo, independente de sua denominação ou natureza jurídica. Portanto, na análise de pertinência ou não de inclusão de uma receita no cômputo da Carga Tributária Bruta (CTB), o juízo econômico prevalece sobre o jurídico. Em geral, consideram-se no cálculo da CTB os pagamentos compulsórios (definido em lei) realizados por pessoas físicas e/ou jurídicas, inclusive as de direito público, para o Estado, excluindo-se aqueles que configurem sanção, penalidade ou outros acréscimos legais”.
Em relação à distribuição por esfera administrativa, o Governo Federal ficou com 70,0% do total da arrecadação, enquanto os estados ficaram com 24,4% e os municípios com 5,5%, conforme tabela abaixo.
Detalhando-se a carga tributária pelas principais bases de incidência, pode-se perceber que os tributos sobre bens e serviços respondem por quase metade do total (49,22%), seguidos pelos tributos sobre a folha de salários (25,76%) e sobre a renda (19,02%). Somados, eles respondem por 94% da carga tributária total. A seguir, traz-se tabela com o detalhamento.
Na comparação com outros países da América Latina, é possível notar algumas diferenças, tanto na composição da carga tributária conforme sua base de incidência, como no seu montante em relação ao PIB. Entretanto, é preciso que se faça uma ressalva quanto à comparação entre a composição das cargas tributárias dos países, pois alguns tipos de tributos podem predominar em alguns países e em outros, não. É o caso das contribuições relacionadas à previdência social estatal que têm considerável importância na composição da carga tributária do Brasil, mas que são pouco representativas naqueles países em que a previdência é predominantemente privada.
No tocante à base de incidência, a tabela a seguir demonstra que o Brasil teve uma participação da Seguridade Social acima da média dos países da América Latina e maior também do que os sete países listados na análise. Por outro lado, a participação de tributos sobre a renda é menor do que a média dos países da região, sendo maior apenas que da Argentina. Os impostos sobre Bens e Serviços representam em média, nos países da América Latina, quase metade da carga tributária. Nos países listados, a única exceção foi o México.
No tocante ao montante da carga tributária em relação ao PIB, o Brasil mostra um perfil diferente da maioria dos países da América Latina. Enquanto que, em média, os tributos equivalem a aproximadamente um quinto do PIB (18,6%), no Brasil esse indicador é quase o dobro, chegando a 34,3% do PIB para 2007 (35,3% para 2011). Dos países relacionados, a Argentina, com 29% do PIB, é o único país que tem uma carga mais próxima da brasileira, conforme tabela a seguir.
Como os tributos têm a finalidade de fornecer recursos para que o Estado atue fornecendo bens e serviços públicos, visando à melhoria das condições de vida de sua população, seria razoável fazer comparação entre a arrecadação e os serviços prestados. Para isso, foi utilizado o Índice de Desenvolvimento Humano – IDH3 como medida indicativa de resultado dos bens e serviços prestados pelo Estado, comparando-a com a carga tributária dos mesmos países mencionados acima. A tabela abaixo demonstra essa relação.
Pode-se notar que muitos países tem carga tributária menor que a brasileira, mas tem IDH maior. O gráfico a seguir, baseado na tabela anterior, torna essa relação mais visual e clara.
É possível notar que o Brasil diverge da tendência dos demais países da região, com alta carga tributária, mas apesar disso, com baixo IDH. Países com IDH semelhante têm aproximadamente metade da carga tributária. A Argentina é a que tem carga tributária próxima, mas com IDH maior.
Fazendo-se a mesma comparação com outros países, esta relação perversa para o caso brasileiro fica ainda mais evidente. De uma lista de 28 países, o Brasil tem a 16a maior carga tributária, mas a 27a colocação em IDH Com isso, o Brasil fica o apenas à frente da Turquia, mas enquanto a carga tributária brasileira é de cerca de 35%, a turca é de 25%, ou seja, quase um terço menor.
No gráfico abaixo, com dados da tabela anterior, o distanciamento do Brasil em relação aos demais países fica ainda mais evidente. É válido destacar que existe uma tendência entre carga tributária e IDH, na qual a maior parte dos países se encontra, mas o Brasil fica bem aquém do resultado.
Assim, o que podemos depreender é que o Brasil tem uma elevada carga tributária, mas os recursos direcionados da sociedade para o Estado não têm sido empregados com a mesma eficiência dos países acima mencionados. Desta forma, o retorno para a sociedade por meio de bens e serviços públicos, que representem efetivamente melhorias na qualidade de vida da população, estão muito aquém dos demais países.
Pode-se afirmar que esse panorama é mais um fator de desincentivo ao adimplemento tributário no Brasil, o que faz com que o investimento no aparato de fiscalização e recuperação de tributos seja ainda mais necessário no combate à sonegação no Brasil.
3 – SONEGAÇÃO FISCAL: determinantes e estimativas Racionalidade da sonegação fiscal: aspectos econômicos e culturais
Quando a carga tributária é muito alta e a probabilidade de detectar a sonegação é baixa, é economicamente racional para pessoas físicas e jurídicas sonegarem (ALLINGHAM e SANDMO (1972); ENGEL e HINES Jr (2000)). Elementos culturais interferem na frequência e intensidade da sonegação, mas fato é que a sonegação está presente em todas as sociedades.
SLEMORD (2007) alerta que estamos enganando a nós mesmos, quando se trata de sonegação e correlatos, ao revisar o que se sabia até então sobre a magnitude, natureza e determinantes da evasão fiscal, particularmente para os EUA. A literatura registra que sonegar não é novidade pelo menos desde o Império Romano, e que os valores sonegados são sempre substancialmente elevados. Entre os determinantes da sonegação, os valores de uma sociedade são sempre o elemento potencializador do comportamento sonegador. Em algumas sociedades, como as nórdicas, os cidadãos sentem orgulho em pagar tributos e a informalidade é baixa, como indica as estimativas para países da OCDE; mas para a América Central e do Sul, as estimativas indicam informalidade quase 3 vezes maior (AHMED e RIDER, 2008), conforme tabela abaixo.
Também influencia a sonegação o tamanho do governo. Na medida em que o Estado cresce, e junto com ele a carga tributária, tentativas de enganar o fisco se tornam mais toleráveis, e a confiança no governo tende a diminuir. Sendo a honestidade tributária, por vezes, considerada uma “honestidade patológica” (SLEMORD, 2002).
Várias tentativas de obter evidência empírica para os determinantes não econômicos da tributação foram feitas, via de regra, usando dados do World Value Survey (WVS). TORGLER (2006) analisou a relação entre religiosidade e moralidade fiscal. Os microdados referentes a indivíduos de 30 países sobre educação religiosa, sobre frequência às igrejas, sobre organização religiosa, percepção da religiosidade, entre outros, levaram o mencionado autor a concluir que há relação positiva entre religiosidade e moralidade fiscal.
Nesta linha de raciocínio, RICHARDSON (2006) analisa também dados do WVS para 45 países e conclui que elementos não econômicos têm forte impacto na evasão fiscal. Em particular, a complexidade do sistema tributário. Além disso, nível educacional (escolaridade), fonte de renda, sentimento de justiça e moralidade fiscal. Quanto menor a complexidade e quanto maior a educação, serviços como fonte de renda, sentimento de justiça e a moralidade fiscal; menor a sonegação.
4 – MODELO TEÓRICO
4.1 – Metodologias de Estimação: características e dificuldades
A mensuração da evasão fiscal, tanto no Brasil, quanto nos outros países, é repleta de complicações e dificuldades. A maior delas se refere aos dados disponíveis e a sua baixa confiabilidade.
Vários métodos têm sido usados em todo o mundo para a estimação, sobretudo, da evasão. Alguns deles tentam medir de forma direta e outras de forma indireta. Entre os métodos diretos podemos citar os que se utilizam de: 1) contas nacionais, 2) controles diretos; 3) pesquisas de orçamento domiciliar; 4) pesquisa de comportamento do contribuinte. Os métodos indiretos estão geralmente associados à estimativa da economia informal, que uma vez estimada, é associada à “sonegação fiscal”.
A seguir são descritas as características dos principais métodos:
a) Contas Nacionais:
Talvez o mais comum e mais utilizado método de mensuração da taxa de evasão fiscal. Ele adota a comparação entre a estimativa de receita feita pelas autoridades de contabilidade nacional com o montante efetivamente arrecadado. A diferença entre o montante arrecadado e a receita estimada daria a indicação, consoante esse método, da receita não declarada. Se a alíquota do imposto for fixa, pode-se estimar diretamente a evasão, caso contrário, seria necessário ainda considerar nas declarações as várias isenções e deduções.
b) Método por Amostragem:
Este método consiste em gerar uma amostra aleatória dos contribuintes e atribuir a toda população a evasão fiscal da amostra. Nos EUA a última estimativa foi feita em 2006 e publicada em 2012. Elas são feitas a cada 5 anos aproximadamente, pois levam anos para serem analisadas e comparadas com dados de outros órgãos. A taxa de evasão foi estimada em 20%, sendo que desse total, 66% eram indivíduos, 16% empresas e 18% outros. Entretanto, este método mede apenas a tributação sobre a renda, mas não mensura a tributação sobre o consumo, que é muito relevante no Brasil, foco deste estudo.
c) Pesquisa Direta com os Contribuinte:
Alguns países, especialmente os nórdicos, se utilizam da pesquisa direta com os contribuinte. Ela consiste em escolher uma amostra aleatória de contribuintes e pedi- los, entre outras coisas, para descreverem seu comportamento com relação ao pagamento de impostos. Este método sofre uma série de críticas, que vão desde a possibilidade de os indivíduos não se lembrarem de seu comportamento passado até dúvida sobre o fato de esses contribuintes estarem realmente dispostos a fornecer informações precisas sobre a questão. Assim, é provável que os dados obtidos por este método sejam subestimados.
d) Método da Pesquisa de Orçamento:
É baseado nas pesquisas de orçamento familiar, que mostram a relação entre os gastos familiares e suas rendas declaradas. Quando há um gasto superior à renda, há suspeita de evasão. Entretanto, o gasto pode ser influenciado por outros fatores como riqueza acumulada, empréstimos e outras diferenças. Esses resultados não são muito confiáveis e podem fornecer apenas uma ordem de grandeza da evasão.
e) Método Indireto:
Método essencialmente relacionado à quantificação da economia informal ou submersa. A utilização dos indicadores da economia informal para determinar indicador de evasão fiscal apresenta diversas dificuldades, dentre elas o fato de que grande parcela dos indivíduos que estão à margem do sistema tributário em decorrência da informalidade desenvolvem atividade cujo nível de renda estaria albergada por isenção, ou ainda, não leva em conta a evasão fiscal promovida pelas pessoas físicas e jurídicas que exercem atividade formalizadas.
Como visto, todos os métodos de mensuração da evasão fiscal apresentam suas dificuldades. Estimar a taxa de sonegação no Brasil apresenta ainda outro grande problema que é a dificuldade de obtenção de informações de todas as esferas de governo, sobretudo das administrações estaduais e municipais, já que se tem 26 estados e o Distrito Federal e mais de 5 mil municípios, em diversos estágios de desenvolvimento institucional.
4.2 – Revisão da Literatura: Características e Limitações de Outros Estudos
Vários estudos foram consultados e serviram de base de pesquisa para a elaboração deste trabalho. Cada um deles tem características próprias, como escopo, tipo de tributo analisado, metodologia adotada, limitações de sua metodologia, etc. A seguir serão comentados os estudos considerados mais relevantes, entre todos levados em consideração neste trabalho.
a) SIQUEIRA (2006). Evasão fiscal do imposto sobre a renda: uma análise do comportamento do contribuinte ante o sistema impositivo brasileiro.
O ponto central desse trabalho é explicar como o comportamento do contribuinte afeta o nível de evasão do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF), por meio da expansão do modelo de Allingham e Sandmo (1972).
O modelo proposto por eles descreve a evasão do imposto sobre a renda como um processo de tomada de decisão de portfólio, utilizando a teoria da utilidade esperada desenvolvida por von Neumann e Morgenstern. Nesse sentido, supõem que um contribuinte racional representativo considera a renda omitida (ou a evasão da renda) um ativo de risco, que depende da possibilidade de detecção da omissão e de sua consequente punição e, a partir de então, maximiza uma função de utilidade esperada.
Para testar o modelo proposto, o mencionado autor utilizou alguns indicadores que se baseavam em dados como: 1) Número Total de Declarações Auditadas (Malha); 2) Número Total de Contribuintes Apenas Fiscalizados; 3) Número total de Contribuintes em Malha e Fiscalizados.
Entretanto, indicadores como esses possuem algumas limitações, que devem ser consideradas e ponderadas para possíveis extrapolações dos resultados da experiência para o universo dos contribuintes. O próprio autor enumera as seguintes:
1) o critério de seleção dos contribuintes pode estar viesado por indícios prévios de “sonegação” e até mesmo por denúncias, já que os resultados relativos à renda não-declarada se referem, tão somente, aos contribuintes fiscalizados pela Secretaria da Receita Federal – SRF;
2) outra restrição que se enfrenta é que as estimativas baseadas em dados da Secretaria da Receita Federal – SRF relacionam-se somente aos declarantes, não trazendo quaisquer informações sobre os não-declarantes. Conforme observou Franzoni (1999), os não-declarantes são parte importante da atividade sonegadora e desconsiderá-los pode enviesar tais estimativas;
3) sabe-se que as auditorias fiscais têm uma capacidade limitada de detectar a evasão, especialmente em relação às rendas dos autônomos e daqueles que realizam somente operações em dinheiro; assim, em alguns casos, os valores evadidos podem ser um pouco maiores que os estimados com base somente nas auditorias;
4) por último, deve ser ressaltado que estudos baseados em pesquisas amostrais enfrentam diversos problemas. Entre eles, o mais importante é que os resultados dependem crucialmente da representatividade da amostra e de eventuais vieses de seleção.
Do estudo em referência foi utilizada neste relatório a estimativa de evasão do Imposto de Renda de Pessoa Física – IRPF, que foi de 34,09%, a partir de dados de 1998 (declaração do exercício de 1999).
b) PAES (2011). O Hiato Tributário do Imposto sobre Produtos Industrializados Evidências Setoriais
Neste artigo o autor analisou o hiato tributário do IPI partindo de uma fonte altamente desagregada, a PIA – Produto4, e de informações detalhadas da legislação do IPI, para obter estimativas do hiato por setor econômico no período entre 2001 e 2007.
Primeiramente, o autor calculou a alíquota média esperada de IPI para cada setor. Depois, já de posse de tais alíquotas setoriais, ele fez ajustes pertinentes para o cálculo da arrecadação legal, que é a arrecadação esperada obtida ao se aplicar as alíquotas médias legais sobre a base do imposto. Neste segundo momento, são também considerados os créditos tributários do IPI na aquisição de insumos, os benefícios da Zona Franca de Manaus, bem como isenções e imunidades divulgadas pela Receita Federal do Brasil (RFB). Finalmente, calcula-se o hiato tributário, que é a arrecadação legal esperada deduzida da arrecadação realizada.
Destaque-se que o hiato tributário não significa necessariamente a presença de sonegação, embora esta possa vir a ser um dos seus principais componentes. Segundo o mencionado autor setores em que a presença de benefícios fiscais é significativa e cujos benefícios são particularmente difíceis de serem mensurados, podem apresentar hiatos maiores, devido à dificuldade de se calcular as estimativas do tamanho de tais benefícios. Além disso, fatores como a informalidade e a visibilidade do setor para a fiscalização também podem contribuir para o hiato tributário. Claramente o hiato tributário é o resultado de um conjunto de fatores complexos, relacionados a aspectos institucionais, legais e culturais.
Os percentuais de hiato tributário ou tax gap encontrado nesse estudo foram adotados, a título de simplificação para o trabalho que ora se apresenta, como percentual de sonegação de IPI, tendo sido feita uma média ponderada de todos os indicadores encontrados nos anos avaliados pelo trabalho, chegando-se a um percentual de 33,4%.
c) SABAINI e JIMÉNEZ (2011). “Tax structure and tax evasion in Latin America”
Esse artigo estuda a estrutura tributária de alguns países da América Latina, mostrando a sua evolução ao longo do tempo, o contexto histórico e os seus efeitos sobre o consumo e a renda. Ele demonstra a grande importância dos IVA (Imposto sobre Valor Agregado ou VAT – Value Added Tax) na arrecadação desses países, seguido do Imposto de Renda, que nesses países tem foco principal nas empresas. Os mencionados autores mostram que, apesar da diversidade, os sistemas tributários da grande maioria dos países da América Latina dividem algumas características relevantes: a composição das suas estruturas tributárias; as restrições técnicas, econômicas, políticas e administrativas que eles enfrentam; tendências de políticas tributárias e administrativas; e um elevado indicador de sonegação.
Segundo seus próprios autores, os objetivos do trabalho são:
1) Estudar a evolução e as maiores características do nível típico e estrutura de tributação na região nos últimos 20 anos, identificando importantes diferenças entre os países da região e os agrupando;
2) Destacar os principais obstáculos e restrições que a maioria dos países tem encontrado na tentativa de aumentar suas receitas e modificar a suas estruturas
3) Detalhar as principais políticas adotadas pelos países nos anos recentes;
4) Analisar os vários aspectos da evasão, como os métodos de estimação, as informações disponíveis, as informações em casos específicos onde tenha havido progresso significante na mensuração;
5) Analisar as estratégias implementadas para aumentar a coleta das principais tributos, bem como os indicadores de desempenho.
A estimativa de evasão fiscal do estudo é feita com base no VAT e no Imposto de Renda de Pessoa Física e Jurídica de alguns países da América Latina. Entretanto, ao se analisar as estimativas deve-se ter cautela, pois o processo de estimação encontra uma série de dificuldades. Em geral, não encontram grandes diferenças metodológicas na estimativa da evasão de imposto de renda das empresas. Em regra, elas partem da exploração das contas nacionais, com alguns ajustes, por problemas de disponibilidade e qualidade de informações. Quanto ao imposto de renda de pessoa física, partem de pesquisa de orçamento familiar ajustados segundo as contas nacionais. Este tipo de pesquisa é limitado, pois os entrevistados tendem a sub- declararem sua renda ou não reportá-las. Outra dificuldade é a definição da base de imposto tributável e da quantidade de tratamentos especiais e deduções. Quanto ao VAT, o método mais comum é fazer a estimativa pelas contas nacionais e comparar com a taxa efetiva. Entretanto, a precisão da estimativa depende da confiabilidade dos dados, que podem ser afetados por uma grande gama de regimes especiais e isenções.
Desse trabalho foi utilizado o parâmetro de evasão de VAT como um balizador em relação à estimativa do VAT brasileiro, construído neste estudo a partir dos indicadores conjuntos do IPI, ICMS e ISS, sendo que a estimativa de sonegação para cada um desses tributos se baseou em estudos do IBPT (2009) e Paes (2011).
d) AMARAL, OLENIKE, AMARAL & STEINBRUCH (2009): Estudo sobre a Sonegação Fiscal das Empresas Brasileira, IBPT.
O objetivo desse estudo, segundo seus próprios autores, é estimar o montante de tributos sonegados pelas empresas no Brasil, bem como o indicador de sonegação por setores e por tributos.
A base de dados utilizada foram os balanços de fiscalização da Receita Federal do Brasil, do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, das Secretarias de Fazenda dos Estados, e das Secretarias de Finanças das Capitais.
Nesse estudo foram analisados 9.925 autos de infração lavrados contra empresas de todos os portes, sendo que 26,84% tinham fortes indícios de sonegação.
É importante registrar que a utilização dos resultados deste tipo de estudo, ou seja de estudos baseados em autos de infração deve ser feito com alguma cautela, pois os dados podem ser tendenciosos por conta da amostra enviesada (sem considerar os casos em que a sonegação não foi descoberta) . Geralmente os órgãos fiscalizadores não fazem uma escolha aleatória das empresas a serem auditadas. O mais comum é que eles adotem algum critério indicativo de evasão para selecionar as empresas ou a fiscalização decorra de denúncia.
Das conclusões desse trabalho foram extraídos parâmetros para estimar a evasão de diversos tributos, sobretudo àqueles incidentes sobre as empresas, entre eles o ICMS.
4.3 – Modelo Proposto e Metodologia Adotada
Conforme já abordado anteriormente, a literatura sobre mensuração da sonegação fiscal é bastante escassa em todo o mundo e, sobretudo, no Brasil. Os poucos estudos existentes abordam um tributo ou um pequeno grupo deles. Cada um desses estudos adota uma metodologia própria, de acordo com a disponibilidade de dados. A escassez de dados e a sua baixa confiabilidade estão entre os maiores desafios a serem enfrentados por aqueles que se propõem a estimar a evasão fiscal. A diversidade de regimes especiais de tributação e de benefícios fiscais torna ainda mais complexa a estimação.
A comparação entre países é também outro desafio, pois além das dificuldades mencionadas, deve-se levar em consideração ainda as especificidades dos sistemas tributários de cada país. Neste trabalho, optou-se, então, por adotar um modelo que reunisse os indicadores encontrados em outros estudos, para cada tipo de tributo, com o fim de estimar um indicador médio provável da sonegação no Brasil. É claro que cada um dos estudos tem as suas próprias limitações decorrentes das metodologias adotadas e da disponibilidade de dados, conforme já abordado anteriormente, mas esta foi a maneira de se ter uma estimação média do patamar de sonegação no Brasil.
Não obstante a existência de limitações metodológicas, o presente estudo tem como inspiração a patente necessidade de aprofundamento da discussão sobre a Justiça Fiscal, a carga tributária e o relacionamento do Estado com o Cidadão, tanto na perspectiva “estado-fisco x cidadão-contribuinte”, quanto na perspectiva “estado- provedor x cidadão-beneficiário” de serviços públicos.
5 – ESTIMAÇÃO
5.1 – Resultados Nacionais
Para se estimar o indicador percentual de evasão para o conjunto de tributos brasileiros, este estudo se utilizou da carga tributária brasileira do ano de 2011, publicados pela Receita Federal5, e dos indicadores de outros estudos como SIQUEIRA (2006), PAES (2011) e IBPT (2009), conforme detalhado na tabela abaixo.
Apesar de haver no Brasil algumas dezenas de tributos, os 13 detalhados na tabela acima somaram 89,0% do total da arrecadação tributária no ano de 2011, enquanto os demais (linha “outros”) somaram apenas 11,0%. Devido a sua grande representatividade para o total dos tributos, apenas o primeiro conjunto de tributos foi utilizado para as estimações deste trabalho.
O cruzamento dos resultados dos estudos adotados neste trabalho com a carga tributária equivalente a cada Iundmicadodr does tributos referenciados resultou em um indicador estimado médio de sonegação de 23,9% da arrecadação, que equivale a 8,4% do PIB, o que representaria o valor de R$ 349,8 bilhões caso levado em conta o PIB do ano de 2011.
5.2 – Outros Resultados no Brasil e em outros países
O presente estudo, como já versado, busca contribuir para a estimação da sonegação tributária para todo o conjunto de tributos no Brasil tomando como base os estudos existentes, inobstante as diferenças de metodologia e premissas e as limitações de representatividade respectivas.
Devido às diferentes estruturas tributárias dos países é difícil obter parâmetros internacionais para comparação desses sistemas. Mais raro ainda são estudos que apresentem estimativas das taxas de evasão em diversos países com relação a tributos que apresentem base de cálculo e hipóteses de incidência semelhantes.
Os tributos com características semelhantes sobre os quais foram obtidas por estes autores estimativas de evasão fiscal se referem ao Imposto de Renda e ao Imposto sobre Valor Adicionado (Value Added Tax – VAT). Com base no estudo de Jiménez e Sabaini (2012) sobre a evasão para Imposto de Renda e VAT foi possível fazer uma comparação entre os dados informados por aqueles autores e a estimativa adotada neste estudo. Com base na tabela de estimativa de evasão fiscal no Brasil, apresentada no tópico anterior, a evasão relacionada ao Imposto de Renda seria de 30,3%.
O VAT, por sua vez, presente em diversos países, é um imposto que incide sobre a despesa ou consumo e tributa o “valor agregado” nas transações efetuadas pelo contribuinte. No Brasil, pode-se afirmar, a grosso modo, que o correspondente a este imposto está dividido em três impostos: IPI (imposto sobre produtos industrializados), de competência da União; ICMS (imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual, intermunicipal e de comunicação), de competência dos estados e do DF; e ISSQN ou ISS (imposto sobre serviços de qualquer natureza, com exceção dos impostos compreendidos em Circulação de Mercadorias), de competência dos Municípios e também do DF.
A tabela a seguir demonstra que os tributos que corresponderiam ao VAT no Brasil são responsáveis por quase 26% da carga tributária total e teriam segundo estimativa apresentada no tópico anterior um indicador de sonegação da ordem de 27,6%. Este indicador de evasão é o mesmo apontado como média para a alguns países selecionados da América Latina no estudo de Sabaini e Jiménez (2012).
O indicador de evasão para o VAT no caso brasileiro é estimado neste estudo em 27,6%, equivalendo a 2,5% do PIB. Seu resultado é muito influenciado pela estimativa do indicador de sonegação para o ICMS, uma vez que este tributo equivale a aproximadamente 80% do valor que poderia ser atribuído ao conjunto de tributos brasileiros equivalente ao VAT.
A seguir, apresenta-se tabela com a comparação da estimativa de evasão de Imposto de Renda e VAT de alguns países da América Latina com os estimados para o Brasil.
Na tabela acima, podemos notar que o indicador de sonegação encontrado para o conjunto de tributos do Brasil correspondentes ao VAT é bem próximo ao encontrado nos demais países latino-americanos relacionados, sendo, inclusive, igual à média linear do indicador desses países. Por outro lado, a estimativa de sonegação para o Imposto de Renda no Brasil adotado neste estudo ficou abaixo da média daqueles países, tanto no que se refere às pessoas físicas, como também no que diz respeito às corporações.
Abaixo, podem ser vistas de forma mais gráfica a relação entre as estimativas internacionais relatadas por Jiménez e Sabaini (2012) e as indicadas neste estudo. A diferença pode estar no fato de ambas se utilizarem de metodologias diferentes. Para o caso brasileiro foi adotada a pesquisa do IBPT (2009) para o imposto de renda das corporações e de Siqueira (2006) para o das pessoas físicas. Ambas não capturam o mercado informal e são baseadas em dados oficiais, seja em autuações ou em dados da Sonegação do Imposto de Renda e VAT – América Latina Receita Federal que apenas levaram em conta as empresas formais. Por outro lado, os estudos de JEistmimaétivnaez e SabImapionstoi (2012) são baseados em estimativas macroeconômicas que capturam o mercado informal.
Em 1991, em um artigo publicado na Folha de São Paulo, o economista André Franco Montoro Filho estimou, de forma simplificada, que a carga tributária potencial no Brasil seria de 43% distribuídos conforme tabela abaixo.
À época, a carga tributária era de 25% do PIB, havendo com isso uma sonegação, segundo a afirmação de Montoro, de aproximadamente 18% (=43% – 25%) do PIB. Este número serve como balizador para comparação com a estimativa do presente estudo, cujo indicador estimado foi aproximadamente 24% para uma carga tributária de 35% do PIB. Se a evasão fosse zero, isso indica que seriam arrecadados aproximadamente 43% do PIB (35% x 1,24). Ou seja, em ambos os estudos, a carga tributária potencial máxima para uma evasão zero de 43% do PIB.
Entretanto, os mencionados números só confirmariam um ao outro se o aumento da carga tributária tivesse se dado inteiramente em razão do incremento da eficiência da arrecadação e não em virtude do aumento de alíquotas e do alargamento das hipóteses de incidência dos tributos. Apesar de ser notório ter havido nos últimos 20 anos um aumento da eficiência da arrecadação e a redução do mercado informal, não parece razoável atribuir este aumento da carga tributária de 25% para 35% do PIB apenas a esses dois fatores, sendo mais provável que parte desse incremento da arrecadação se deva ao aumento de alíquotas e das bases de incidência dos tributos.
6 – CONCLUSÕES
A elevada carga tributária no Brasil é tema frequente de debates na sociedade, bem como a discussão quanto à sobrecarga suportada pelos contribuintes adimplentes em função da evasão tributária existente. Este trabalho teve como meta principal encontrar um parâmetro que indicasse uma ordem de grandeza para a evasão tributária no Brasil. Entretanto, por sua própria natureza, estimar um indicador de evasão tributária é uma tarefa complexa e que carece de disponibilidade de dados, pois há um grande número de tributos, com diferentes alíquotas, isenções e benefícios tributários. Além disso, são escassos os dados referentes àqueles que evadem, pois não constam dos dados oficiais e não possuem incentivos de se manifestarem por pesquisas de entrevistas. Os estudos também são escassos em outros países.
Nesse sentido, o meio encontrado foi apoiar o trabalho em outros estudos que faziam estimativas de um ou um grupo de tributos e a partir deles estimar um parâmetro que conferisse uma ordem de grandeza da evasão para toda a carga tributária do Brasil.
Existem várias limitações neste tipo de trabalho. Uma delas é que ele herda todas as limitações dos trabalhos nos quais se apoiou, como, por exemplo, a representatividade da amostra que pode estar viesada, a dificuldade de capturar o mercado informal ou ainda de albergar a multiplicidade de alíquotas e benefícios fiscais. Outros resultados foram utilizados como balizamento do resultado obtido neste estudo. Um deles é o que buscou definir um indicador de evasão para o VAT em países da América Latina e encontrou, na média, a mesma ordem de grandeza encontrado por este trabalho, de aproximadamente 28%. Para imposto de renda, a estimativa deste estudo ficou abaixo da média dos outros países da América Latina: 30% versus 51%, talvez em função de diferenças metodológicas.
Os resultados indicaram que, mantendo todos os demais parâmetros constantes, a arrecadação tributária brasileira poderia se expandir em 23,9% caso fosse possível eliminar a evasão tributária cujo indicador médio para todos os tributos apontado neste trabalho foi da ordem de 8,4% do PIB.
Na hipótese ainda de se levar em conta apenas a média dos indicadores de sonegação dos tributos que têm maior relevância para a arrecadação (ICMS, Imposto de Renda e Contribuições Previdenciárias) poder-se-ia estimar um indicador de sonegação de 28,4% da arrecadação (percentual muito próximo do indicador de sonegação para o VAT em países da América Latina que foi de 27,6%), que equivale a 10,0% do PIB, o que representaria o valor de R$ 415,1 bilhões caso levado em conta o PIB do ano de 2011. Tomando-se em consideração esse último indicador para a sonegação, poder-se- ia afirmar que se não houvesse evasão, o peso da carga tributária poderia ser reduzida em 28,4% e ainda manter o mesmo nível de arrecadação. Esses R$ 415,1 bilhões estimados de sonegação tributária são superiores a tudo o que foi arrecadado, em 2011, de Imposto de Renda (R$278,3 bilhões), a mais do que foi arrecadado de tributos sobre a Folha de Salários (R$ 376,8 bilhões) e a mais da metade do que foi tributado sobre Bens e Serviços (R$ 720,1 bilhões).
Por fim, registra-se que o presente relatório não teve pretensão de esgotar o assunto e sim de fomentar a discussão sobre a justiça fiscal e sobre o ainda alarmante patamar de sonegação tributária no Brasil.
7 – BIBLIOGRAFIA
AMARAL, G.L; OLENIKE, J. E.; AMARAL, L. M. F. (IBPT) Carga Tributária Brasileira 2012. Março de 2013
AHMED, RA; RIDER, M. Pakistan’s tax gap: estimates by tax calculation and methodology. Georgia State University. Andrew Young School of Policy Studies. International Studies Program Working Paper 08-11, December 2008.
ALLINGHAM, MG; SANDMO, A. Income tax evasion: a theoretical analysis. Journal of Public Economics 1 (1972) 323-338.
EDWARDS, C. The Federal Tax Gap. Testimony to Budget Committee, United States House of Representatives, 2007.
ENGEL, EMRA; HINES Jr; JR. Understanding tax evasion dynamics. NBER working paper 6903. 2000.
FEISNTEIN, JS. An econometric analysis of income tax evasion and its detection. RAND Journal of Economics, vol 22, n1, 1991.
GEMMELL, N; HASSELDINE, J. The tax gap: a methodological review. Working Paper in Public Finance 09/2012. Victoria Business School. University of Wellington. New Zealand. September, 2012
GÓMEZ SABAINI, J.C., JIMÉNEZ, J.P.; A. PODESTÁ, A. (2010), “Tributación, evasión y equidad en América Latina”, Evasión y equidad en América Latina, J. P. Jiménez, J. C. Gómez Sabaíni y A. Podestá (Comp.), Project Document, No. 309 (LC/W.309) Santiago, Chile, ECLAC/GTZ.
HOLMES, Stephen; SUSTEIN, Cass R. The cost of rights: why liberty depends on taxes. New York: W.W. Norton &Company, 1999
LOAYZA, NA. The Economics of the Inform al Sector : A Simple Model and Some Empirical Evidence from Latin America. World Bank Policy Research Paper 1727. 1997.
MOREIRA, André Mendes. Elisão e Evasão Fiscal – limites ao planejamento tributário. Revista da Associação Brasileira de Direito Tributário, Belo Horizonte, Vol.21, mar.-abr. 2003, pp. 11-17.
NACIONAL FRAUD AUTHORITY (USA).Annual Fraud Indicator. Published January 2011.
OLIVEIRA, FA. A evolução da estrutura tributária e do fisco brasileiro: 1889- 2009. IPEA. Texto para discussão 1469. Brasília, janeiro de 2010.
OLENIKE, J. E.; AMARAL, G.L; AMARAL, L. M. F; STEINBRUCH, F. (IBPT) Estudos sobre a Carga Tributária/PIB x IDH. Janeiro de 2012
_____.Estudo sobre Sonegação Fiscal das Empresas Brasileiras (IBPT). Março de 2009
PAES, Nelson Leitão. O Hiato Tributário do Imposto sobre Produtos Industrializados Evidências Setoriais. RBEE. Revista Brasileira de Economia de Empresas, v. 11, p. 39-51, 2011.
POLINSKY, A. Mitchell; SHAVELL, Steven. Handbook of law and economics. North-Holland: Amsterdam, 2008. p. 406-407
RICHARDSON, G. Determinants of tax evasion: A cross-country investigation. Journal of International Accounting, Auditing and Taxation 15 (2006) 150– 169
RECEITA FEDERAL DO BRASIL. Carga Tributária no Brasil 2011. Brasília, novembro de 2012.
SABAINI, J. C. G; JIMÉNEZ, J. P., Tax structure and tax evasion in Latin America. CEPAL, Economic Development Division. Santiago, February 2012
SLEMORD, J Trust in public finance. NBER working paper 9187. 2002.
SLEMORD, J; YTIZHACK, S. Tax avoidence, evasion, and adminstration. NBER working paper 7473. 2000.
SILVA, AN. Os crimes fiscais e o refis: modos para diminuir a evasão fiscal. Câmara do Deputados do Brasil, 2005.
SIQUEIRA, M.; RAMOS, F. A Economia da Sonegação: Teorias e Evidências Empíricas. Revista de Economia Contemporânea, v.9, n.3, p.555-581, 2005.
_____. Evasão Fiscal do Imposto sobre a Renda: Uma Análise do Comportamento do Contribuinte ante o Sistema Impositivo Brasileiro. Revista Economia Aplicada, v.10, n.3, p.243-267, 2006.
TANZI, V; SHOME, P. A Primer on Tax Evasion. Staff Papers – International Monetary Fund. Vol. 40, No. 4 (Dec., 1993), pp. 807-828 Published by: Palgrave Macmillan Journals
TORGLER, B. The importance of faith: Tax morale and religiosity. Journal of Economic Behavior & Organization. Vol. 61 (2006) 81–109
Notas
1http://www.impostometro.com.br/ , http://www.usdebtclock.org/
2 Carga Tributária no Brasil 2011 – Análise por Tributos e Bases de Incidência. Publicado em novembro de 2012 pela Receita Federal.
3 O sítio oficial do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) resume em linguagem simples o que vem a ser o Índice de Desenvolvimento Humano – IDH:
“O objetivo da criação do Índice de Desenvolvimento Humano foi o de oferecer um contraponto a outro indicador muito utilizado, o Produto Interno Bruto (PIB) per capita, que considera apenas a dimensão econômica do desenvolvimento. Criado por Mahbub ul Haq com a colaboração do economista indiano Amartya Sen, ganhador,do Prêmio Nobel de Economia de 1998, o IDH pretende ser uma medida geral, sintética, do desenvolvimento humano. Apesar de ampliar a perspectiva sobre o desenvolvimento humano, o IDH não abrange todos os aspectos de desenvolvimento e não é uma representação da “felicidade” das pessoas, nem indica “o melhor lugar no mundo para se viver”. Democracia, participação, equidade, sustentabilidade são outros dos muitos aspectos do desenvolvimento humano que não são contemplados no IDH. O IDH tem o grande mérito de sintetizar a compreensão do tema e ampliar e fomentar o debate. Desde 2010, quando o Relatório de Desenvolvimento Humano completou 20 anos, novas metodologias foram incorporadas para o cálculo do IDH. Atualmente, os três pilares que constituem o IDH (saúde, educação e renda) são mensurados da seguinte forma: Uma vida longa e saudável (saúde) é medida pela expectativa de vida; O acesso ao conhecimento (educação) é medido por: i) média de anos de educação de adultos, que é o número médio de anos de educação recebidos durante a vida por pessoas a partir de 25 anos; e ii) a expectativa de anos de escolaridade para crianças na idade de iniciar a vida escolar, que é o número total de anos de escolaridade que um criança na idade de iniciar a vida escolar pode esperar receber se os padrões prevalecentes de taxas de matrículas específicas por idade permanecerem os mesmos durante a vida da criança; E o padrão de vida (renda) é medido pela Renda Nacional Bruta (RNB) per capita expressa em poder de paridade de compra (PPP) constante, em dólar, tendo 2005 como ano de referência”. (Disponível em: http://www.pnud.org.br/idh)
4 Pesquisa Industrial Anual de Produto – PIA-Produto. O IBGE traz os seguintes esclarecimentos quanto ao índice:
“As informações coletadas referem-se aos valores de vendas e às quantidades produzidas e vendidas dos produtos e serviços industriais prestados por cerca de 40.000 empresas. A pesquisa é organizada segundo as categorias de atividades definidas na Classificação Nacional de Atividades Econômicas – CNAE, assim como todas as pesquisas econômicas implantadas a partir de 1996. O registro da informação de produtos e serviços se dá, na PIA-Produto, através de uma lista de produtos e serviços preestabelecida, a Lista de Bens e Serviços Industriais – PRODLIST, referência básica para os levantamentos da produção nacional”. (Disponível em: http://www.ibge.gov.br/questionarios/leiame_pia_prod.html)
5 Relatório de Carga Tributária no Brasil 2011 – Análise por Tributos e Base de Incidência. Receita Federal do Brasil. Nov/2012