Orçamento familiar público e orçamento familiar privado

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por João Carlos Loebens*

A palavra ‘orçamento’ nos remete a diferentes mapas mentais ou significados, como, por exemplo, orçamento da obra, orçamento público, orçamento secreto (do Congresso), orçamento participativo, ou orçamento da dona (ou dono) de casa. Esse último poderíamos denominar de orçamento familiar privado.

Parece óbvio que orçamento familiar é ‘privado’. Já usar a denominação ‘orçamento familiar público’ parece coisa de outro mundo! Pois é, ambos existem.

Imaginemos uma família com 3 filhos: pai e mãe trabalham, com salário de R$ 1.500,00 cada um; o filho mais velho (ou filha) estuda em universidade pública e trabalha de estagiário, ganhando R$ 500,00; o segundo filho cursa o 8º ano no colégio municipal, e o filho mais novo está na creche, que custa R$ 600,00 por mês. Somando os salários, essa família ganha R$ 3.500,00 por mês.

Além da creche, digamos que as despesas são: supermercado R$ 1.100,00, aluguel R$ 600, luz R$ 100, condomínio R$ 300, telefone R$ 300 e gasolina R$ 400. Somando as despesas, teremos R$ 3.400,00 por mês. Como a receita de salários é de 3.500 e a despesa é 3.400, sobram R$ 100,00 reais para eventual gasto extra ou poupança.

Esse é o orçamento familiar privado – rendimentos de R$ 3.500 e um superávit de R$ 100 reais/mês. E agora, como incluo o “público” nesse orçamento “privado”?

Para chegar no orçamento familiar público, basta incluir quanto essa família pagaria se os filhos estudassem em instituições privadas. Suponhamos a mensalidade da universidade em R$ 1.500 e escola de oitavo ano em R$ 500 e as consultas médicas em R$ 300, que somados totalizam R$ 2.300/mês.

Dessa forma, no orçamento familiar público, essa família recebe, além dos R$ 3.550 de salário, mais os R$ 2.300 de serviços públicos (universidade, escola, médico), totalizando um rendimento mensal, no orçamento familiar público, de R$ 5.800,00.

Como vemos, o orçamento familiar público é superior ao orçamento familiar privado.

Para finalizar, imaginemos que a universidade, a escola municipal e o SUS sejam privatizados, na linha amplamente defendida pela ideologia neoliberal atualmente predominante. O que aconteceria com a nossa família?

Ao extinguir os serviços públicos de educação e saúde, a renda da família seria unicamente a soma dos salários no valor de R$ 3.500,00, e as despesas da família passariam a incluir universidade, colégio e médicos, passando a despesa a ser R$ 5.700,00, resultando num déficit mensal de R$ 2.200,00.

Nesse contexto de Estado Mínimo, restariam duas alternativas para família: a primeira, buscar um financiamento bancário de R$ 26.400/anuais (déficit de R$ 2.200/mês); ou, a segunda opção, tirar os filhos da universidade/colégio e deixar de ir ao médico.

Com a atual absurdamente elevada taxa de juros, a primeira opção é inviável – o banco nem aceitaria financiar tantos anos sem pagamentos concomitantes. Sobra a segunda opção.

Ou seja, extinguindo o orçamento familiar público, com o “Estado Mínimo” das privatizações ilimitadas (ou Estado Privatista), para “nossa família” sobraria somente a triste e lamentável opção de ficar sem educação e sem assistência médica.

Há uma outra alternativa: para o “Estado Mínimo” neoliberal funcionar, faz-se necessário “Salário Máximo” para as famílias viabilizarem a inclusão das contas de educação e saúde no orçamento familiar privado! Ora, se o Estado diminui, diminui o orçamento familiar público, gerando déficit nos orçamentos das famílias menos favorecidas economicamente (a maioria das famílias brasileiras). A solução para eliminar o déficit do orçamento dessas famílias seria então aumentar o lado das receitas, o lado do salário, equilibrando dessa forma o orçamento familiar!

Aumentando o salário das famílias, elas passarão a ter renda suficiente para pagar colégio privado, médico privado, hospital privado, segurança privada, estrada privada, recolhimento privado de lixo, aposentadoria privada etc. Aumentando o salário das famílias, elas passam a ter renda suficiente para pagar por todos esses serviços.

Ou seja, para que o equilíbrio seja mantido no Estado Mínimo Privatista resulta que temos que ter o Estado Máximo Salarial.

Bueno, isso já são outros quinhentos …

*João Carlos Loebens é Diretor de Cidadania e Educação Fiscal do IJF