Onde está a justiça na proposta de reforma eleitoral? Por Maria Regina Duarte.

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As propostas apresentadas pela comissão que está tratando da reforma política estão na direção contrária aos anseios da população, pelo menos da que saiu às ruas recentemente. Sob o argumento de tornar a eleição mais democrática e menos burocrática, a comissão está propondo, no final das contas, fiscalizar menos o financiamento das campanhas eleitorais, já que não será mais exigido recibo das doações. Os documentos da prestação de contas dos partidos serão analisados apenas quanto ao seu aspecto formal, não havendo mais o ateste, por parte da Justiça Eleitoral, da compatibilidade da movimentação financeira com o que foi declarado. Afinal, isso poderia ser interpretado como “interferência na autonomia dos partidos”.

Segundo informações dos jornais, a proposta chamada de “minirreforma eleitoral” foi elaborada pelos líderes das principais bancadas que, ao que tudo indica, produziram um texto anacrônico e inadequado. Quando as ruas apontaram para mais fiscalização, menos corrupção, mais transparência, o Congresso parece posicionar-se do lado contrário.

Se há setores da sociedade que apóiam o fim do financiamento público de campanha, outros entendem que não há como manter as doações de empresas, pois elas servem para manter o eleito vinculado aos interesses das empresas doadoras. Certo é que não há, ainda, uma definição da forma de financiamento eleitoral mais adequada ao nosso País.

Uma possibilidade é que somente os filiados aos partidos possam fazer as doações. Outra, é que apenas pessoas físicas possam fazê-lo e abre-se, ainda, uma terceira possibilidade para que o financiamento seja todo feito com recursos públicos. O que importa é tentar impedir caminhos, nebulosos ou declarados, nos quais o dinheiro das campanhas circula e é utilizado como instrumento de compra de mandatos. Como os cidadãos poderão ser representados pelos eleitos se estes recebem polpudas doações de grandes empresas que, certamente, deverão ser “lembradas” durante o curso de seus mandatos?

O voto universal é uma das maneiras que o cidadão tem de fazer valer os seus direitos, mas o financiamento das campanhas eleitorais por parte das empresas claramente subverte o ideal deste voto universal. O cidadão vota, mas quem elege – e tem o recibo para cobrança da eleição, com raras exceções – são as empresas!

A idéia de justiça nos remete a uma situação de equilíbrio, de maior igualdade, inclusive no exercício dos direitos. Continuando o sistema eleitoral vigente, alguns terão, digamos assim, bem mais direitos que outros e a busca pela justiça terá grandes desafios na sua implantação. Não será diferente na busca pela justiça fiscal.


Maria Regina Duarte é Auditora Fiscal da Receita Federal do Brasil e conselheira do Instituto Justiça Fiscal.