Fluxos ilícitos privam governo de receitas e impulsionam economia subterrânea, alimentando criminalidade e corrupção. Um desafio aos candidatos a presidente nestas eleições
Mais de 30 bilhões de dólares ligados ao crime, à corrupção e à evasão de impostos saem do Brasil a cada ano. O valor é o dobro do que saia na década passada e dez vezes mais a quantia que saia nas décadas anteriores – revelou estudo da Global Financial Integrity (GFI), organização sediada em Washington que pesquisa e faz advocacy pela transparência financeira.
O estudo, intitulado “Brasil: Fuga de Capitais, Fluxos Ilícitos e Crises Macroeconômicas, 1960-2012 e financiado pela Fundação Ford, afirma que o faturamento fraudulento nas transações comerciais – sub ou sobrefaturadas – foi responsável por 92,7% dos $401,6 bilhões que saíram ilicitamente do Brasil entre 1960 e 2012. Os outros US$ 29,4 bilhões deixaram o país por saídas de capital especulativo tais como transferências bancárias não registradas.
O estudo foi debatido na conferência realizada no Rio de Janeiro pela GFI e Instituto Multidisciplinar de Desenvolvimento e Estratégias (MINDS), em setembro. Intitulada “Fluxos Financeiros Ilícitos no Brasil: Um Recurso Escondido para a Promoção da Prosperidade e da Estabilidade Econômica”, a conferência explorou a escala, causas e consequências dos fluxos financeiros ilícitos no Brasil, e as possíveis políticas para combatê-los. Entre os participantes estava o economista Marcos Antonio Macedo Cintra, do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) e ligado à Campanha TTF Brasil.
O estudo, de autoria do economista chefe da GFI, Dev Kar, estima que as saídas ilícitas de capital do Brasil mais que dobraram nos últimos anos. De US$ 310 milhões anuais na década de 1960, saltaram para US$ 14,7 bilhões na primeira década deste século e para US$ 33,7 bilhões de 2010 a 2012.
“As saídas ilícitas drenam capital da economia brasileira, facilitam a evasão fiscal, acentuam a desigualdade e corroem a poupança interna do país”, afirmou Dev Kar, ex-economista sênior do FMI. “Mais preocupante é que as saídas ilícitas aumentaram ao longo do tempo — de pouco mais de US$ 300 milhões por ano na década de 1960 para mais de US$ 30 bilhões em média por ano atualmente. A menos que sejam tomadas medidas corretivas, o custo econômico desses fluxos ilícitos só continuará a crescer.”. Em média, os capitais que deixam o Brasil clandestinamente, a cada ano, equivalem a 1,5% do PIB do país.
Entre as medidas recomendadas ao governo brasileiro durante a conferência estão a promoção de maior transparência em transações financeiras nacionais e internacionais; e mais cooperação entre os governos no sentido de fechar os canais pelos quais capitais ilícitos fluem – esta, fora do alcance nacional. A fiscalização aduaneira, medidas de transparência e a vontade política são vistas como elementos essenciais para o combate à criminalidade, à corrupção e à evasão fiscal.
“Os fluxos financeiros ilícitos constituem um problema muito sério para o Brasil e combatê-los deve ser prioridade para qualquer candidato a presidente que ganhe as próximas eleições”, observou no Rio o presidente da GFI, Raymond Baker, autoridade em crimes financeiros.
Metodologia
Segundo o GFI, o estudo apresenta uma das mais rigorosas análises de fluxos financeiros ilícitos já realizadas pela organização. Ainda assim, para Dev Kar os modelos usados provavelmente não captam todos os fluxos de capital clandestino que sangram o Brasil.
“É provável que as estimativas desenvolvidas com base na nossa metodologia sejam extremamente conservadoras, já que não incluem o faturamento indevido no fluxo do comércio de serviços, o faturamento fraudulento com base no uso de uma mesma fatura em mais de uma operação, transações realizadas por canais informais conhecidos como redes hawala e negócios realizados com dinheiro em espécie”, explicou o Kar.
“Isso significa que o enorme volume de recursos resultante da transferência abusiva de preços entre controladas, coligadas ou filiais de uma mesma empresa multinacional, bem como a maior parte das receitas provenientes do tráfico de drogas e de seres humanos e de outras atividades criminosas — geralmente pagas com dinheiro em espécie — não está incluído nessas estimativas”, concluiu.
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