À convite do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait), IJF participa de evento no dia 20/01/2017
Dirigentes do Sinait, Auditores-Fiscais do Trabalho, advogados trabalhistas e representantes de entidades sociais discutiram retrocessos promovidos pelo Congresso Nacional e pelo Poder Executivo no segundo semestre de 2016. O debate aconteceu durante o Seminário “Denunciar, Resistir e Avançar: não vamos permitir retrocessos”, atividade integrante do Fórum Social das Resistências, promovido pelo Sinait no dia 20 de janeiro, no Parque da Redenção, em Porto Alegre (RS).
A diretora do Sinait, Ana Palmira Arruda Camargo, coordenou as reflexões promovidas pelos painelistas Antônio Escosteguy Castro, advogado trabalhista; Ricardo Garcia, procurador do Trabalho; Dão Real, Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil, que representou o Instituto da Justiça Fiscal; Luciana Stahnke, juíza do Trabalho e Guiomar Vidor, presidente da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil – CTB/RS.
O advogado trabalhista Antônio Castro abriu o Seminário do Sinait fazendo uma explanação sobre a conjuntura política atual do país. Segundo ele, o período representa um ataque sem precedentes a todos os direitos dos trabalhadores. Mas não se restringe aos trabalhadores, alcançando também as comunidades que não sejam parte da elite. Situação que recebe reforço por meio de propostas do governo, como as reformas da Previdência e Trabalhistas.
Para Antônio Castro, “a proposta de reforma da Previdência é um absoluto despautério”. São 65 anos como idade mínima para homem e mulher; 49 anos de contribuição para o valor integral. “A reforma é pior do que parece. Você não pode ficar um dia sem contribuir. Isso é impossível”.
Segundo ele, a reforma trabalhista é tão ruim, que bastava apenas aprovar o antigo Projeto de Lei 4.330/2004 aprovado pela Câmara dos Deputados, que agora está no Senado como PLC 30/2015, que trata da terceirização. “Eles estão propondo uma reforma ainda mais cruel do que o próprio PL 4.330”. Além disso, criticou que, num lance de marketing, o governo autorizou a retirada do FGTS que estava paralisado. “Na verdade, 5% das contas têm mais de 10 bilhões de reais, que ao invés de financiar habitações populares e saneamento, vai ser imediatamente aplicado em fundos bancários”.
Antônio Castro alertou ainda para um decreto do ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, que reduziu os poderes da Fundação Nacional do Índio – Funai, no que se refere às demarcações das terras indígenas. “O decreto libera terras para plantar e escavar minerais. Eles refizeram um decreto da época do Fernando Henrique”.
Segundo ele, esses são exemplos de um programa de governo que é de absoluta crueldade. “As medidas vêm depois de um golpe que podemos chamar ‘golpe parlamentar judiciário midiático’”. Para Castro, “é um programa impossível de ser aplicado por um governo eleito”.
Desmantelamento do Estado
De acordo com o procurador do Trabalho Ricardo Garcia, as colocações de Antônio Castro são pertinentes e precisam ser reforçadas, pois o governo atual trabalha intensamente pela retirada de direitos. “Vem intensificando o desmantelamento do Ministério do Trabalho e incapacitando agências que eram parceiras das áreas que efetivamente fiscalizam”.
O procurador explicou que o poder financeiro do Estado está sendo direcionado para atender apenas aos interesses do capital financeiro nacional e internacional. “Acompanhamos também o desmantelamento da representatividade do Brasil no cenário internacional. Um exemplo é o enfraquecimento de sua participação no Brics e no Mercosul. Além do ataque à Petrobras, também com esta intenção”.
Para Ricardo Garcia, todos os ataques estão ligados e foram planejados há muito tempo. “O que estamos assistindo é um desmantelamento de uma estrutura nacional, que começou nos anos 1940 e nunca foi aceita pelos Estados Unidos e pelo capital financeiro internacional. O golpe de 1964 foi para fazer isso e não conseguiu”.
O problema, explica Garcia, é que o país nunca teve organizações sociais tão desmobilizadas e um Congresso Nacional tão conservador. Segundo ele, o Congresso, durante regime militar, era capaz de opor resistência, apesar da falta de liberdade dos partidos, dos sindicatos e das organizações populares. “Esses setores identificavam imediatamente o inimigo conseguindo se organizar para opor alguma resistência. Coisa que não temos hoje, porque o Golpe não sofreu nenhuma resistência dos segmentos representativos”. Ele analisa que “as passeatas e os protestos não tiveram força de barrar absolutamente nada e que também não sensibilizaram o Congresso Nacional. Afinal, eles são capazes de barrar esses retrocessos e não o fizeram”.
Disputas de recursos
Dão Real, Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil, participou do Seminário em nome do Instituto Justiça Fiscal, organização civil que atua na temática da justiça fiscal. Ele alertou para o fato das pessoas estarem abrindo mão de seus direitos, conquistas, sonhos e construção coletiva em função de um discurso falacioso. “A mídia serve a um processo de doutrinação”.
Para ele, vivencia-se hoje um processo acelerado de reformas desestruturantes. “As bases das reformas estruturais foram construídas em 1988, e no dia seguinte à promulgação da Constituição começou o processo de sua destruição. Lembrando que houve resistências no passado”.
O pesquisador alerta que, apesar dos avanços nos últimos dez anos, com a incrementação dos gastos sociais, o dinheiro não se inventa. “O dinheiro não se inventa, pega num lugar e se coloca em outro. Isso representa uma disputa de alocação em que cada governante decide se investe mais na área social ou privada”.
Real explicou que o que está em disputa permanentemente é o recurso total do Estado. “Há uma disputa entre os recursos para serem investidos na área social e na área privada. Essa é à base do conflito e todas as reformas passam por aí”. Disputas que migram para o Congresso Nacional por meio das disputas entre os segmentos que lutam por investimentos sociais e os financiadores das campanhas políticas.
28 de janeiro
A juíza do Trabalho Luciana Stahnke aproveitou para destacar duas propostas que estão tramitando no Congresso Nacional, como o PL 1.572/2011, na Câmara, sobre o Código Comercial, e o PLS 432/2013, no Senado, que regulamenta a Emenda Constitucional 81. A emenda desapropria áreas em que for identificado trabalho escravo.
Segundo ela, o Código Comercial recebeu uma emenda que pode inviabilizar a fiscalização do trabalho. “A emenda determina que a empresa seja avisada 48 horas antes da ação fiscal. Isso inviabiliza a fiscalização e não podemos permitir que passe”. Ela lembrou ainda que o processo de combate ao trabalho escravo inicia-se na fiscalização do Trabalho, que precisa ser fortalecida. “Como permitir uma medida que enfraquece a fiscalização?”.
A juíza do Trabalho lembrou que o Sinait, Anamatra e a ANPT emitiram uma Nota Técnica conjunta contra o Código Comercial. “O documento foi entregue ao relator da proposta, deputado federal Paes Landim (PTB/PI), e esperamos que a emenda seja retirada”. Ela disse ainda que as entidades precisam lutar para que o artigo 149 do Código Penal não seja alterado. “O código é muito bom e não pode ser modificado”.
Ela aproveitou para relembrar o dia 28 de janeiro: Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo. Data escolhida para marcar o dia em que três Auditores-Fiscais do Trabalho – Erastóstenes de Almeida Gonsalves, João Batista Soares Lage e Nelson José da Silva – e o motorista Ailton Pereira de Oliveira foram assassinados, em 2004. Segundo ela, o acontecimento chocou o país. “Aconteceu numa fazenda em uma estrada rural de Unaí, interior de Minas Gerais”.
De acordo com Luciana Stahnke, a criação das Comissões Estaduais de Erradicação do Trabalho Escravo – Coetraes veio com o objetivo de fortalecer o combate ao trabalho escravo e evitar que situações de violência voltem a acontecer.
Segundo ela, no caso de Porto Alegre (RS), a Coetrae foi criada em 2012, só que foi ratificada apenas no dia 13 de janeiro deste ano. “É algo ainda incipiente que precisa mudar, já que foi ratificada apenas por mais 15 Estados”. Ela afirma que a participação precisa crescer e ser fortalecida. “O trabalho escravo contemporâneo precisa ser extirpado da sociedade. Todos precisam participar”.
Problemas estruturais
Guiomar Vidor, presidente da CTB/RS, alegou a existência de uma grande ofensiva neoliberal que favorece as reformas. “A crise política e econômica que o Brasil vive favorece as reformas, já que o sistema como um todo está fragilizado e as representações socais enfraquecidas”.
Para o sindiscalista, a situação é muito preocupante, principalmente no que se refere ao aumento do desemprego e à mudança da dimensão do problema. “O desemprego mostra-se estrutural. As vagas que estão sendo fechadas não voltarão a se abrir porque o próprio sistema de trabalho também está em transformação”. Este sistema, segundo Guiomar, respalda os retrocessos propostos e apoiados pelos setores conservadores. “Infelizmente, não é apenas no Brasil, mas na América Latina e também no mundo”.
Reforçando discursos anteriores Guiomar disse que as várias investidas sobre os direitos sociais e trabalhistas não aconteceram aleatoriamente. “Não é só o poder Executivo que atua na retirada de direitos. O impedimento da presidente Dilma não foi uma simples mudança de governo, mas, sim, um plano orquestrado pelas classes dominantes, grande mídia, partidos políticos conservadores, setores empresariais, parcela do Judiciário e da Polícia Federal, para viabilizar a retirada de direitos”.
Nesta linha, segundo Guiomar, estão os processos de desestruturação propostos pelo Executivo. A renegociação das dívidas dos Estados, por exemplo, foi feita mediante imposições como demissão de servidores e privatizações. Ele citou também a PEC 55/2016, Emenda Constitucional nº 95 de 2016, que congela por 20 anos investimentos públicos na educação e saúde, e as reformas da Previdência e do Trabalho, entre outras coisas.
Além dos painelistas, o debate também teve contribuições de Auditores-Fiscais do Trabalho, professores, representantes sindicais e integrantes dos movimentos sociais que acompanharam o Seminário promovido pelo Sinait, no Parque da Redenção, em Porto Alegre.
fonte: Sinait