Curso incentiva debate sobre impostos e gastos públicos no Brasil

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Em sua 7ª edição em 2019, o curso de extensão Educação Fiscal e Cidadania já capacitou cerca de 300 pessoas em temáticas relativas a tributos, impostos, políticas públicas e despesas governamentais. Exemplo de interação entre Universidade e sociedade, a iniciativa promove o debate sobre finanças públicas e estimula a participação social nos governos em todas as instâncias.

Na UFRGS, a ação é coordenada pela professora Rosa Chieza, do Departamento de Economia e Relações Internacionais da FCE. A Superintendência da Receita Federal do Brasil da 10ª Região Fiscal – Alfândega Porto Alegre, a Subsecretaria da Receita Estadual/RS, a Prefeitura Municipal de Porto Alegre e o Instituto Justiça Fiscal  também são responsáveis por manter vivo o projeto.

O curso é gratuito e aberto a todos os interessados, independentemente de formação ou de vínculo com a UFRGS. Já participaram das atividades jornalistas, líderes comunitários, professores de ensino fundamental e médio e estudantes de graduação, entre outros. A cada ano, novos temas são incorporados ao programa de aulas, com o objetivo de manter a formação atualizada em relação aos temas da agenda pública. Neste ano, por exemplo, há palestras e debates específicos sobre as reformas em curso no Brasil, em especial nas áreas previdenciária e tributária.

A proposta do curso surgiu para levar assuntos como tributação e gastos públicos à população comum e esclarecer sobre mitos que são divulgados muitas vezes por desinformação”, sintetiza Rosa. De acordo com a docente, a sociedade dissemina diversas informações equivocadas sobre o modo como o governo brasileiro arrecada os tributos, quanto cada cidadão paga de impostos e também sobre o que é investido em serviços públicos. “Queremos que as pessoas se capacitem e também se tornem multiplicadoras do conhecimento em suas comunidades”, defende.
 

Turma de 2019 do curso Educação Fiscal e Cidadania
Turma da edição de 2019 do curso, com alunos e professores

 Mitos: Brasil tem a maior carga tributária do mundo e outros

Uma das discussões que mais gera surpresa entre os participantes do curso é a que trata dos mitos. “Alguém cria, outros repetem e os demais acreditam e passam adiante. E quanto mais a narrativa é ouvida sem reflexão, mais se torna verdade”, explica a professora, que ministra também a disciplina de Economia do Setor Público na graduação.

Segundo ela, há três principais mitos que o curso Educação Fiscal e Cidadania busca desconstruir nas aulas. O primeiro deles afirma que o Brasil tem a maior carga tributária do mundo. Conforme dados de 2018 da OCDE, a nação com a maior carga é a Dinamarca, onde os tributos arrecadados correspondem a mais de 45% do PIB. No Brasil, esse percentual é de 32%, o que corresponde à 24ª posição na lista. “Ou seja: o Brasil não é o país com a maior carga tributária do mundo e os dados mostram isso”, observa Rosa.

Essa conclusão, de acordo com a professora, leva as pessoas a criarem um segundo mito: o de que o Brasil tem uma carga tributária parecida com as de países europeus, mas não entrega serviços públicos tão qualificados como eles. Para a docente, a questão é mais complicada e envolve acrescentar à discussão outros números, como PIB e tamanho da população do Brasil, por exemplo.

Para ilustrar a questão, ela compara Brasil e Reino Unido, que têm a mesma carga tributária: cerca de 32%. “Se nós dividirmos o total da arrecadação anual pelo número de pessoas que vivem aqui, vamos ver que o Brasil tem disponível cerca de US$ 2.800 para gastar com cada brasileiro por ano. No caso do Reino Unido, se fizermos a mesma conta, vamos ver que eles têm, com a mesma carga tributária, US$ 13.000 para gastar com cada cidadão”, argumenta. Isso ocorre porque o Brasil tem uma população maior e um PIB menor do que o Reino Unido, complementa.

Outro mito é o de que o governo precisa fazer que nem a dona de casa: gastar só o que recebe” pontua a economista. Para ela, é justamente o contrário: “o Estado deve arrecadar o que gasta porque tem condições de fazer política monetária, estabelecer a taxa de juros, poderes que influenciam a condução da macroeconomia e os resultados de sua própria arrecadação e do seu gasto. E a dona de casa não tem nenhuma possibilidade de fazer isso”, sustenta.

Se considerarmos todas as variáveis constantes e o Governo elevar a taxa de juros básica da economia para combater a inflação, por exemplo, a consequência será o aumento dos gastos públicos (em juros), desequilibrando as contas públicas. E isso não ter nada a ver com ‘gastança’, como tem sido repetido por alguns formadores de opinião”, desmente Rosa. A professora provoca ainda uma reflexão: “você conhece alguma dona de casa que faz política macroeconômica?

O curso ainda avança sobre a discussão a respeito de ricos e pobres e a quantidade de impostos pagos pelos indivíduos. “No Brasil, proporcionalmente, quem tem as menores rendas paga muito mais imposto do que aqueles com os maiores rendimentos”, afirma. “Nós tributamos muito o consumo e pouco a renda. Nos Estados Unidos, por exemplo, é muito barato fazer compras porque eles tributam pouco o consumo. Por outro lado, os impostos sobre renda nos EUA são de cerca de 50% do total arrecadado por aquele país. No Brasil, esse percentual é de 21%”, elucida Rosa.
 
Conhecimento para além da sala de aula

Para ser aprovado no curso de Educação Fiscal e Cidadania e receber certificado, é preciso ter 75% de presença nos encontros e fazer um trabalho de conclusão, que consiste em um projeto para compartilhar com outros cidadãos o conhecimento obtido nas aulas. “Os participantes propõem e depois realizam palestras, minicursos e outras atividades de conscientização, disseminando o conhecimento”, exemplifica a professora.
Um grupo de alunos já organizou uma edição de Educação Fiscal e Cidadania para estudantes da Escola Afonso Guerreiro Lima, em Porto Alegre. O colégio fica no bairro Lomba do Pinheiro, região com o menor IDH da capital gaúcha. “Ao final das aulas, eles pediram que os jovens da escola identificassem a presença do Estado no bairro, como paradas de ônibus, o próprio colégio, posto de saúde etc”, explica. Com isso, foi possível discutir com os alunos a presença do Estado nos bairros, despertar neles o sentimento de pertencimento e refletir sobre direitos e deveres do cidadão. Os projetos de final de curso também geraram iniciativas pelo interior do Rio Grande do Sul, levando o debate para outras cidades do Estado.

Em 2018, o curso foi transformado em livro, ampliando ainda mais o alcance das lições sobre educação fiscal e cidadania. Neste ano, com o apoio do Sindifisco-RS (Sindicato dos Servidores Públicos da Administração Tributária do Estado do Rio Grande do Sul), foi possível imprimir 1.000 exemplares da obra para distribuição gratuita. Até então, o livro Educação Fiscal e Cidadania – Reflexões da Prática Educativa estava disponível apenas para download em formato eletrônico. Em 2019, o projeto também foi contemplado com a doação pela Receita Federal de dois notebooks e um projetor para serem usados nas atividades do curso.

Aulas deram origem a livro
Aulas deram origem a livro, que pode ser acessado gratuitamente pela internet

Inscrições abrem todos os anos

A turma de 2019 do curso já está em andamento, mas todos os anos uma nova edição é lançada. A divulgação é feita nos canais de comunicação da Faculdade de Ciências Econômicas e das demais instituições organizadoras.
Outras informações sobre o curso podem ser obtidas com a professora Rosa Chieza, pelo e-mail rosa.chieza@ufrgs.br.