Como o sistema tributário e os gastos sociais reduzem as desigualdades

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por Pierre Jacquet – Presidente da Global Development Network (Rede de Desenvolvimento Global), em Nova Delhi

 

Uma economia nacional pode se desenvolver reduzindo desigualdades: o desempenho da América Latina é testemunho disso. Medidas pelo índice de Gini (que varia de 0, para uma distribuição de renda totalmente igualitária, a 1, para uma concentração total de renda, nos extremos da escala), as desigualdades se reduziram em 13 dos 17 países da região durante os anos 2000. Como?

Os professores Nora Lustig (Universidade de Tulane, em Nova Orleans, Louisiana) e Peter Hakim (Inter-American Dialogue, um think tank com sede em Washington) lançaram uma iniciativa ambiciosa para documentar esses resultados: o projeto “Compromisso com a Equidade” (Commitment to Equity, ou CEQ) analisa a eficácia das políticas fiscais e sociais em matéria de equidade.

Esse projeto (www.commitmentoequity.org) já permitiu até agora a publicação de vários estudos sobre a Argentina, Bolívia, Brasil, Paraguai, México, Peru e Uruguai.

Perdendo apenas para a Serra Leoa

No Brasil, o índice de Gini caiu todos os anos desde 2001, ao passo que o país estava, no final dos anos 80, atrás apenas de Serra Leoa em termos de desigualdade. No estudo The Effects of Brazil’s High Taxation and Social Spending on the Distribution of Household Incomes (“Os efeitos da alta tributação e dos gastos sociais do Brasil sobre a distribuição da renda familiar”), Sean Higgins e Claudiney Pereira, da Universidade de Tulane, confirmam o impacto significativo do programa símbolo de transferência condicional de dinheiro, o “Bolsa Família”.

Mas eles também mostram que os benefícios desse programa, muito difuso, concentram-se nas famílias mais ricas e não alcançam os mais pobres. Por outro lado, o sistema de impostos indiretos, regressivo e cumulativo entre Distrito Federal, estados e municípios, elimina em parte os benefícios das transferências sociais.

Reforma dos impostos indiretos

Por fim, o estudo confirma que as “transferências em espécie” que representam os gastos com educação (exceto ensino superior, ao qual as famílias pobres pouco chegam) e com saúde desempenham um papel determinante na redução das desigualdades. Em 2009, por exemplo, o coeficiente de Gini passou de 0,574 para 0,542 sob efeito das transferências diretas e da tributação, e em seguida para 0,464 graças aos gastos sociais.

Apesar dos resultados obtidos, os autores concluem que face ao nível elevado de tributação e dos gastos públicos, a eficácia da política social brasileira continua insuficiente. Eles recomendam a reforma dos impostos indiretos, sobretudo daqueles que incidem sobre alimentos básicos, a expansão do Bolsa Família, principalmente para tornar elegíveis as famílias mais pobres, e o acesso facilitado desses últimos ao ensino superior.

Esses trabalhos podem ser úteis para orientar os países em desenvolvimento na elaboração de suas políticas sociais. Eles permitem identificar as medidas eficazes e mostrar como medir seu impacto. Esperamos que esse importante trabalho possa se estender a outros países, do qual também poderiam se inspirar os países industrializados cujo “modelo social” está hoje em crise.

Artigo originalmente publicado emhttp://www.lemonde.fr/economie/article/2013/04/02/comment-la-fiscalite-et-les-depenses-sociales-reduisent-les-inegalites_3151930_3234.html