Maria Regina Paiva Duarte *
Até algumas semanas atrás, as delações da empresa Odebrecht nos faziam pensar que presenciaríamos o fim da política e o mais dramático desastre da economia. Então, apareceu a delação da JBS e novamente as estruturas internas nacionais foram reviradas e mais um capítulo da novela que se arrasta há tempos nos foi apresentado.
A JBS não é uma empreiteira como a Odebrecht e as outras empresas envolvidas na Operação Lava Jato, então, alguns atores mudaram. Mas o enredo, este parece bem semelhante porque, ainda que a JBS não faça obras de grande porte, no Brasil e/ou no exterior, patrocina e promove a antiga e agora mais evidente relação corrupta e imoral entre estas empresas e o poder público que, entre outras ações, financiam as campanhas políticas sem nenhuma outra intenção que não seja a de levar vantagens.
O que ainda parece nebuloso e opaco para a população confusa, que assiste os enredos novelescos, é que tipo de atuação teremos daqui para frente. Sem fazer a reforma política necessária, parece difícil e quase impossível mudar o cenário, até porque os diretores e atores principais e coadjuvantes serão praticamente os mesmos.
Sem dúvida precisamos combater a corrupção, é um mal que corrói a esperança do povo brasileiro de ver melhores condições de saúde, educação, segurança, saneamento, emprego. Mas esse tipo de relação entre empresas e poder público não é restrito ao nosso querido Brasil e às empresas brasileiras. Não podemos esquecer as várias empresas estrangeiras que, com o propósito de “desenvolver o Brasil” algumas décadas atrás, pagaram propina, subornaram pessoas, alteraram legislação e foram instalando mecanismos de captura da democracia que ainda hoje passam despercebidos pela imensa maioria do povo brasileiro.
Nesse contexto, é interessante notar que, justamente em um período em que o Brasil estava se firmando como potência, sexta economia mundial, essa corrupção toda tenha vindo à tona e empresas como Petrobrás e Odebrecht, outrora líderes regionais, tenham se transformado em males a serem combatidos. Evidentemente que mal fizeram, e devem pagar por isso, mas quem vai agora ocupar esse espaço?
Quando a sensação que ficamos é a de que, como ouvimos e vemos nas ruas, na mídia, nas redes sociais, o Brasil precisava mesmo passar por isso, que nenhum político presta, que pagamos nossos tributos inutilmente, pois serão desviados e roubados, podemos estar abrindo um espaço para que, em meio à nova (ou não tão nova assim) investida do neoliberalismo, aqueles mesmos mecanismos de captura da democracia e do Estado reapareçam, mesmo que com outras roupagens.
Isso porque sequer nos apercebemos que a escassez de recursos, motivo da nova investida neoliberal e da ofensiva contra o estado de bem-estar social que temos visto no Brasil e na América Latina, muitas vezes é fruto da elisão fiscal propiciada por brechas na legislação obtidas graças ao relacionamento promíscuo entre as empresas e o parlamento e governo nacionais. Ainda que permitida, a elisão fiscal, é um mecanismo poderoso de fuga de recursos que poderiam ser aproveitados, mediante tributação, em benefício da população brasileira.
Assim, não é conveniente, nem adequado, que nos deixemos enganar pelo discurso que aponta para a “limpeza da nação”. O que parece bom, a princípio, pode deixar opaca a verdadeira intenção de permanecer tudo ou quase tudo como está, quer dizer, quem pode mais, paga menos tributos, porque tem a seu favor a possibilidade de efetivamente ditar a política econômica e fiscal. Estamos falando dos bancos, das empresas transnacionais, dos milionários e do estado capturado por eles.
Não queremos com isso demonizar o setor privado, os bancos, as grandes empresas, mas fazer com que paguem o justo, assim como as pessoas físicas com mais altas rendas. Trata-se de não aceitar conviver com altos índices de evasão, elisão, sonegação e elevados estoques de dívida junto à União, não cobradas, e jogar a conta para o setor mais desfavorecido, levando adiante essas contrarreformas em curso.
- Diretora-Administrativa do IJF