É razoável que um tributo pago diretamente pelo cidadão e retido pelo responsável tributário seja “apropriado indevidamente” por esseresponsável tributário?
É justo que o governo, que deveria coibir tal prática com os rigores da lei, ao contrário, facilite ao infrator devolver o valor apropriado aos cofres públicos, e em consequência à sociedade, de forma parcelada em camaradas prestações?
Deixar de repassar à Previdência Social, contribuições sociais descontadas dos salários de segurados empregados, constitui-se em ilícito penal tipificado no art. 168-A do Código Penal, como crime de “apropriação indébita”.
Aproveitando-se de permissivos legais, os próprios contribuintes “confessam” a apropriação indébita, e nada ocorre. Nenhuma representação pelo crime cometido é feita.
A contribuição previdenciária do segurado empregado é retida antecipadamente, portanto o trabalhador brasileiro cumpre com seu dever fiscal ao final de todo mês, ao receber seu salário com o desconto de sua contribuição social devida. O empregador, entretanto, possui a possibilidade de repassar os recursos arrecadados, e que deveriam trazer benefícios à sociedade, no momento mais oportuno a este, e de forma convenientemente parcelada.
Leis de parcelamentos especiais editadas pelo governo, como a Lei 11.941/2009, reaberta por diversas vezes através das Leis 12.996/2014 e Lei 13.043/2014, deram oportunidades às empresas para parcelarem e reparcelarem débitos de tributos federais nas diversas modalidades previstas em leisanteriores, e que permitem não só o parcelamento com redução de multas e acréscimos legais, como por vezes incluem a possibilidade do parcelamento de contribuições sociais, descontadas diretamente do salário do trabalhador. Mais recentemente, o parcelamento simplificado concedido em atualizações à Lei 10.522/2012, também possibilitaram o parcelamento da contribuição do segurado empregado, mesmo que incluídas algumas limitações. Criada especificamente para os débitos relativos às contribuições previdenciárias de responsabilidade dos Estados e municípios, a Lei 12.810/2013, também possibilita tal parcelamento.
Observando a regularidade com que tais leis são editadas e reeditadas, podemos crer que os contribuintes podem inclusive se programarem tributariamente, e simplesmente aguardarem o anúncio de tais medidas governamentais. E o que presenciamos é o “dinheiro suado” do cidadão, pago em favor da cidadania, indo para o bolso de algumas empresas.
Admitir o parcelamento da apropriação indébita é financiar as empresas com o valor pago pelo cidadão.
E quando você consumidor, comprar um bem ou serviço, de imediato você também paga PIS, COFINS, IPI… Basta observar as notas fiscais e boletos de pagamento de serviços públicos. Estes tributos compõem o preço final da mercadoria ou bem adquirido. É o consumidor final quem paga o tributo. E este pagamento não é opcional, caso contrário não poderá levar para casa aquela geladeira novinha, por exemplo.
Se o cidadão não pagar, não tem acesso ao produto ou serviço posto à venda. E os tributos que ele pagou, pois compuseram os preços eforam destacados, podem ser parcelados?
Se essa possibilidade for considerada correta, estaremos admitindo o financiamento das empresas com o uso do tributo pago diretamente pelo cidadão.
Que tipo de cidadania estaríamos afinal praticando em nosso país?
Sob esta análise, a adoção de ajustes fiscais que venham a penalizar ainda mais a sociedade seriam totalmente desnecessários, e não nos parece apropriado que o cidadão brasileiro venha a pagar mais uma vez por esta conta.
Caso nossos governantes revissem seus programas de recuperação fiscal equivocados e que só beneficiam a quem comete crimes tributários, pondo fim aos parcelamentos que envolvem apropriação indébita, não haveria outra opção para empresas que cometem ilícito penal, senão a de cumprirem com seu dever legal. Nada mais legítimo e justo para o aumento potencial da arrecadação.
Os Auditores Fiscais defendem um Brasil com maior justiça fiscal, um Brasil mais justo e melhor.
Delegacia Sindical de Goiânia
Texto aprovado em Assembleia Geral de 15/01/2015 – autorizada a sua divulgação desde que citada a fonte.